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domingo, 3 de maio de 2020

PADARIA SÃO DOMINGOS e Adoniran, o João Rubinato de Valinhos/SP


PADARIA SÃO DOMINGOS e Adoniran, o João Rubinato de Valinhos/SP
O Adilson Correa trouxe esta foto das lembranças no espaço do Viva São Paulo Antiga.


Gente, que fantástico! Feliz lembrança, pois que, morei, ainda na juventude, por volta dos 18/20 anos, ao lado desta padaria lá pelos idos de 1970... E ela, por vezes ainda frequento, mesmo que decorridos 50 anos. Residia eu na esquina da Rua São Domingos, fazendo esquina com a Rua Humaitá - Bela Vista, e de lá só sai para subir ao altar da Igreja da Consolação, casando-me então e estando ainda presente com Isabel Conceição Costa Ferreira!

Quanto ao personagem, qualquer hora te conto de quantas ouvi, vi e vivi... Um personagem que, a par de sua bronquite, não hesitava em baforar seu habitual cigarro. Fui privilegiado pela vida, nas lembranças, na consagração do amor, nas experiências vividas e, deste personagem - Adoniran, o João Rubinato de Valinhos/SP - que representava no rádio das antigas e para o samba, ao longo dos tempos, o Adoniran Barbosa.

Confundindo-se com seu próprio personagem, ainda outro vivido, o “Charutinho”, que através do rádio, contava e vivia as peripécias inclusive das “habitações coletivas”, as malocas situadas nos casarões da Bela Vista e suas andanças. O jornalista Oswaldo Moles, sucessor de Antonio de Alcântara Machado na literatura paulista e tido como o “pai” de Adoniran Barbosa, por volta de 1956, estando na Rádio Record, conheceu e escreveu para o rádio de então o Programa História das Malocas, momento que Adoniran, contracenando com a comediante Mariamélia, vivendo esta o papel de Pafunça, além de Terezeca, tudo sob inspiração do samba Saudosa Maloca que na gravação original não teve tanta repercussão, só posteriormente nas vozes e com os Demônios da Garoa.

Do “Pai do Samba paulistano”, guardo lembranças de sua voz rouca e das diversas interpretações, eu ainda quando criança e assíduo ouvinte do rádio, momento que o programa vinha ao ar às sextas-feiras, sempre às 9 horas da noite e retratava o cenário que muito imaginava do Morro do Piolho e, cujo personagem, de uma malandragem que sempre o levava a sair-se mal, não gostando de trabalhar.  Nos raros encontros que tivemos tempos adiante, tantas risadas e tiradas que fazíamos do cotidiano duro, e duro na acepção da palavra... Pairava muita dureza no bolso, no ar!

Ao seu lado, que naquele tempo no rádio já vivia o humor executado por apenas um comediante e que se apresentava geralmente em pé, sem acessórios, cenários, recurso teatral da quarta parede, diferenciando o stand-up de um monólogo, portanto, nenhuma novidade o modismo atual, onde fabrica-se risadas por meio  de stand-up, “fazendo-se cócegas nos espectadores”,  outros expoentes do samba viviam e muitos vivos, tive oportunidade de conhecer alguns, tal como Geraldo Filme – o “Seu Geraldo”, também “Tio Gê” e que, segundo ouvia contar, na infância de “Negrinho das Marmitas” - o sambista da Barra Funda, Germano Mathias, aquele da “caixa de fósforos” e também da “lata de graxa” herança dos engraxates da Praça da Sé, embora nascido no bairro paulistano do Pari, Aldo Bueno, que chegou a ser puxador da Escola de Samba Vai-Vai, Osvaldinho da Cuíca, o “homem da frigideira”, o “Preto no Branco” e que como passista, e muito nele me espelhei, é o autêntico representante de uma arte popular que transita entre a tradição e a contemporaneidade, além de Thobias da Vai-Vai, o seu Edimar, três anos mais velho que eu e que chegou a ser presidente da escola d’onde fui passista.

Filme, também "o Corvão", igualmente era frequentador das “rodas de Tiririca”, no Largo da Banana, no embrião das escolas de samba em São Paulo na Barra Funda, local hoje substituído por um viaduto que liga dois trechos da Avenida Pacaembu, onde os negros, no início do século 20, se reuniam aguardando a chegada do trem que trazia mercadorias do interior para a capital paulista, então em tempos de espetáculos como “Balbina de Iansã” e “Pagodeiros da Pauliceia”, onde, verdadeiramente, se sambava e pagodeava ao som da “caixa de engraxate”, do “latão de lixo”, da “palma de mão” e “tampa de graxa”. Sambava-se mesmo, algo parecido com capoeira e “fazendo visagem” e, não “só no sapatinho” ... No básico “quadradinho” e sim como se fazia na “Cidade da Folia” onde, tomando-se o bonde desembarcava-se ali perto do Parque Antártica, mesmo depois, tudo com parceria de Plínio Marcos:

Um povo que não ama e não preserva suas formas de expressão mais autênticas jamais será um povo livre”.

Plinio, muito depois, incomodou a ditadura, sendo autor de Barrela e Navalha na Carne, com texto duro e com a característica de apresentar ao público histórias e músicas de compositores desconhecidos, anônimos, gênios de pouca popularidade oriundos das Escolas de Samba da capital paulista e que “não podia ser calada” e, donde, “dessa gente que só berra da geral sem nunca influir no resultado”!

Neste local, o Largo da Banana, Dionísio Barbosa, negro da primeira geração de escravos livres, nascido em 1891 em Itirapina (anteriormente comarca de Rio Claro) um dos precursores do legítimo samba paulista, próximo do pátio de manobras dos trens e ponto de reunião e encontro de sambeiros, fundou o primeiro cordão carnavalesco paulista, do Grupo Carnavalesco da Barra FundaCordão Barra Funda/Camisa Verde, primeiro movimento cultural organizado dos negros e primeiro cordão da cidade de São Paulo, no seu início só com 12 personagens.

Quantas vivi... Aquilo sim... Que tempos!

Roberto Costa Ferreira, 03 de Maio, 2020.



Um comentário:

  1. Parabéns .
    Belo depoimento de um tempo que precisa ser registrado e revisitado para não perdermos a nossa tão bela memória paulistana.

    Abraço
    Dalmo Câmara

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