A Psicologia busca a compreensão acerca de como o ser humano cria a sua história, e o papel do psicólogo é utilizar essa ciência para conduzir uma pessoa à autodescoberta, à compreensão sobre as suas dificuldades e a forma com que se relaciona com o seu “mundo interior” e exterior.
Wilhelm Wundt (1832-1920) médico, filósofo e psicólogo alemão é geralmente celebrado nos manuais de história da psicologia como o fundador da psicologia científica. A fundação do Laboratório de Psicologia Experimental da Universidade de Leipzig, em 1879, é geralmente celebrada na literatura como o marco inicial da psicologia científica. No entanto, essa celebração raramente vem acompanhada de um maior esclarecimento acerca do significado daquela realização institucional para o desenvolvimento histórico da psicologia.
Assim, enfatizo a influência de Wilhelm Wundt na formação e no treinamento de toda uma nova geração internacional de psicólogos. É possível compreender, então, que a importância do Laboratório não reside exatamente no fato de ele ter sido o primeiro em seu gênero, mas sim no fato de ele ter se tornado o primeiro centro internacional de formação de psicólogos, embora, às necessárias considerações, a psicologia do século XX não foi "wundtiana em suas feições gerais" simplesmente porque o projeto psicológico de Wundt não foi levado adiante e tomado como base para futuras investigações, mas sim mutilado e adaptado a interesses específicos bem diversos de cada um dos seus estudantes. Ele não deixou discípulos e nem chegou a fundar uma escola de psicologia propriamente dita.
Em outras palavras, o sistema de Wundt como um todo não foi nem discutido nem refutado pelos psicólogos do século XX, mas simplesmente abandonado e esquecido. De outro modo lembro que a psicologia é uma ciência que teve grandes avanços para fornecer compreensão das relações humanas baseadas em metodologias que abrangem campos como clínicos, sociais, trabalhistas e educacionais, propondo em cada área soluções baseadas no desenvolvimento e bem-estar do ser humano. As diferentes situações que podem afetar emocional de uma pessoa, seja por traumas, problemas cotidianos, ou a vontade de melhorar a vida, faz com que o psicólogo seja importante na vida das pessoas que o buscam.
Para
muitos é difícil confiar a alguém seus sentimentos e questões particulares. Os
psicólogos são profissionais "com uma escuta qualificada, construída por anos de estudo, preparados
para analisar e apresentar alternativas". Aqui, neste hiato, demais experiências de
muitos e muito antes contam: Freud e Lacan ao exemplo!
Ao utilizar desde um referencial teórico psicanalítico e orientado pela utilização que Lacan fez do conceito de mito em “A relação de objeto (1956/1995)”, nesta proposta, em moderada análise, observo os procedimentos utilizados para a leitura e agrupamento de dados que encontraram inspiração inicial no modelo estrutural de Claude Lévi-Strauss (1955/1970).
Considero esse método conveniente para abordar a hipótese da pertinência de um traço de escuta específica da psicanálise. Reconhecendo sua condição de perpassar o tempo histórico que é coincidente com a sincronia constituinte da língua, autoriza-me à "análise comparativa da escuta como objeto linguístico em diferentes épocas". Estes procedimentos me permitem - também - indicar no percurso de leitura de textos gregos antigos, ao pé da letra, em que momento surge a posição do sujeito. Assim como Saussure (1916/2014) compôs o conceito de língua discriminando seus elementos constitutivos (fonemas, morfemas, semantemas) para unidades de sentido complexas que abarcam simultaneamente uma temporalidade cronológica e não cronológica, Lévi-Strauss (1955/1970, p. 231) cunhou o termo “mitema”, e nele indicou uma unidade semântica que forma parte da história contada, que se repete e delimita seu valor por oposição das diferenças.
Neste sentido Lacan (1956/1995, p. 260) alertou que a formalização do mito isola elementos cujo funcionamento estrutural se repete sendo “comparável - sem, no entanto, lhe ser idêntico - àquele isolado pelo estudo da linguística”. E aqui, a minha experiência e vivencia. No caso da psicanálise, essas unidades também são reconhecidas como mitemas, sendo adotadas para acompanhar o entendimento do caso clínico do pequeno Hans (Lacan, 1956/1995, p. 262). Não é meu propósito situar o método da psicanálise como sendo similar ao estruturalista, somente estou aproveitando o agrupamento e a diferenciação de elementos para reconhecer dados equivalentes em diferentes tempos. E que se cruzam e auxiliam, vez que, a Psicologia é mais recente ...
Observo - aqui – “a escuta” que, sem formar parte de um mito, mantém caraterísticas que pretendo envolver desde sua sincronia, o que me permitirá indicar como ela se sustenta com similaridades em diferentes períodos históricos, permitindo-nos refletir - inicialmente - a partir do procedimento estrutural. Desde esta perspectiva, sirvo-me dos textos de Freud, identificando a proposta de Lacan, e chego assim até um discurso imediatamente anterior à filosofia idealista de Platão, com o personagem Sócrates apresentado por Platão e Aristófanes. Atenção! Sim, mas flutuante ...
Retomo os textos que prefiguram o tema, nos quais encontro indícios de como Freud acolhia seus pacientes. Ele expôs o que pretendia na primeira parte do capítulo sete do livro A Interpretação dos sonhos, numa descrição da "atitude conveniente da escuta proposta para análise". Sua recomendação começa por afastar o intelecto: “trabalhar como uma besta” (Freud, 1900/2006, p. 554) pela persistência e despreocupação com o resultado. Ou seja, a exposição do material tinha que ser feita considerando qualquer tipo de conexão, sem preocupação pela significação e o sentido que as palavras podiam tomar. Desse modo ficava em suspenso o ato de valorização e, assim, nenhuma parte seria preferível a outra, abstendo-se de críticas por inclinações afetivas ou intelectuais.
Ao paciente era dada licença para vagar de um pensamento a outro, passando por representações que podiam ocorrer sem motivo, parecendo involuntárias, dando total liberdade para ligar ideias fortuitas e sem meta alguma. No estilo de fala invocado, a proposição é abandonar as representações psíquicas com finalidade, aquelas que determinam a escolha de termos e construções de sentido, que Freud denominou “representações-meta”, para em seu lugar liberar o impulso sobre todas as outras possíveis ligações, inclusive aquelas que somente teriam relação com o momento presente e seriam "projetadas na pessoa que escuta".
Naquele tempo, além dos sintomas, também os sonhos foram acolhidos junto às falas que provocavam, como as formações do inconsciente, sem julgamentos, sem preocupação pelos resultados, sem pretensões, abandonando as metas e perambulando pelas ligações. A todo momento seguia o princípio de abster-se de críticas e favorecer à livre associação de ideias. Essa regra indicada para o paciente pressupõe uma posição de Freud como analista, o que lhe permitiu estender seu ouvido, distanciando-se de significações imediatas e sentidos preconcebidos. Doze anos depois, em seus escritos de índole técnica, encontro com maior clareza o reconhecimento da escuta que tinha lhe permitido elaborar a proposta de “associação livre de ideias” para invocar a fala incondicionada de seus pacientes.
No artigo “Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise”, diz que seus conselhos se resumem num único preceito para impedir que o psicanalista acrescente “objeções lógicas e afetivas” (Freud, 1912/2006, p. 129) que o incitariam a escolher uma parte antes de ter à sua disposição todo o material que o paciente é capaz de oferecer, e, basicamente, suas recomendações situam o analista num estado de reserva. Interrogando sua “disposição para escutar”, negligenciou por princípio qualquer modo de registro imediato que retivesse alguns ditos do paciente, e isto em favor de soltar suas ocorrências que, confiava ele, acompanhariam as associações livres.
Aquilo a que Freud deu maior importância não era possível de expressar em termos de atenção focalizada, mas também "sua escuta no que podia ficar rejeitando todos os sentidos”. Expressou esta oposição por oxímoro: “atenção flutuante”, ressaltando por um lado a atenção que apropriadamente é a concentração dos recursos psíquicos sobre alguma representação, e, por outro lado, sua flutuação, a descontração e a labilidade que permitem o deslizamento de nexo em nexo pelas correntes significantes. Em outros termos, sua vontade de atender o deslocamento foi crucial para o achado da técnica.
Das advertências que fez para quem pretende dedicar-se à análise, uma diz respeito à vontade de curar, considerando esse sentimento o mais perigoso (Freud, 1912/2006, p. 128). Advertiu seus colegas sobre a tendência subjetiva que faz ouvir preferentemente o que aparece em torno do mal-estar do paciente e a urgência que nasce em nós quando queremos aliviar a dor do próximo, mas essa tendência, longe de colaborar para a análise, acaba entorpecendo porque age como crítica, como argumento para a resistência do ouvinte, centralizando a atenção sobre uns poucos signos destacados pelo desafeto. Em outros termos, “o furor por sarar, por fazer bem”, faria escolher o que julgamos mais próximo da solução, sem dar espaço às reviravoltas e mudanças que foram as condições das produções sintomáticas que utilizaram ora uma coisa, ora outra, condensando o divergente na complexidade do sofrimento.
A segunda advertência “para viabilizar a escuta” é sobre a pretensão educativa (Freud, 1912/2006, p. 132). Lembrando que uma análise supõe em "quem escuta um saber a mais", o paciente pode solicitar explicações, conselhos, indicações, demandar com direito, na relação profissional, uma resposta conclusiva para seu problema. Por nossa parte também podemos sentir vontade de expor os nossos recursos intelectuais e conhecimentos para dar um bom caminho a seguir, explicando possíveis causas, justificando a chegada dos sofrimentos e até oferecer soluções possíveis. Mais ainda, recomenda a reserva para não impor nem propor seus valores pessoais, crenças, preconceitos, como o bom caminho. A vontade de educar é perigosa, assim como a de curar, até porque sempre está pronta a aparecer em novos ninhos morais.
Quando chegou a hora de Freud caracterizar o oficio de analista, "o indicado para seu modo de escuta era não submeter os casos a reflexões teóricas enquanto aconteciam". Ainda ele preferiu oscilar, indo de uma atitude mental sintetizadora de processos psíquicos (Freud 1912/2006, p. 128) a uma outra, de decomposição e análise. Esse movimento oscilante permite um controle conceitual e abstrato daquilo que compõe uma condição psíquica.
O que o analista deve para si e para o paciente: “Ele deve simplesmente escutar, e não se preocupar se está se lembrando de alguma coisa” (Freud 1912/2006, p. 126). A reserva de opinião implica, para Freud, um exercício de suspensão das críticas e dos valores pessoais e permite ao mesmo tempo a valorização das conexões entre ideias, desconsiderando tanto quanto seja possível suas próprias associações.
Essas primeiras descrições da técnica psicanalítica encontraram apoio na linguística, quando Jacques Lacan, em “A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud” (Lacan, 1957/1995), situou com precisão conceitual "as condições de uma escuta". Assim, destacou, a partir dos exemplos de Freud, o que vinha perfilando realizar-se ao pé da letra. Para oportunizar um encontro clínico são prolíferas as noções derivadas do estudo da linguagem e, nesse aspecto, é necessário ter como princípio a noção de língua como aquilo que existe da linguagem para além do momento da fala. É determinante para a posição do analista que se abra a escuta a termos imprevisíveis.
Lacan valeu-se do conceito de língua de Saussure, em primeiro lugar, por indicar essa parte da linguagem que encontramos numa comunidade como um fato já dado no qual o sujeito se inclui passivamente. A língua é um sistema composto de palavras herdado das gerações anteriores, cujos valores funcionam como num contrato preestabelecido, adquirindo assim uma face individual e outra social no uso. As palavras que potencialmente temos e as que utilizamos compõem a singularidade do falante, incrementam seu estilo, mas também são supostas e corroboradas pelos outros membros de uma comunidade, de modo que "quando escutamos alguém falar, sem desatender as palavras ouvidas, podemos também considerar que existem componentes da língua que permanecem latentes".
Nesse sentido podemos distinguir que a linguagem tem por uma parte a fala com a qual se expressa e por outra parte um rico “tesouro” (Saussure, 1916/2014, p. 172) de significantes disponíveis que um enunciado não mostra na hora, mas, como valores diferentes, sustentam in absentia os significantes que, sim, aparecem. O atender de modo flutuante considera ao mesmo tempo estas duas condições, soltando a abertura da escuta, que estaria dada quando resulta, nos termos de Saussure, na língua como presença da “linguagem menos a fala” (Saussure, 1916/2014, p. 117).
O que escutamos, em termos de Lacan, são significantes, palavras ou grupos de palavras ordenados numa linha temporal em que a fala se desenrola num tempo linear e cronológico. Essa temporalidade permite organizar uma cadeia significante e reconhecemos nela a diacronia (palavra composta por “dia”, que indica fragmentação, e “Cronos”, que é o tempo eterno). Quando uma frase começa se articulam os sons e os silêncios, respeitando uma ordem de posições das palavras, e sabemos que esta organização já está pautada pela gramática da língua. Este aspecto é reconhecido como “o caráter linear de uma cadeia de significantes”. Mas a língua deixa virtualmente todas as palavras à disposição, o que nos permitirá ainda distinguir uma segunda abertura da escuta, como consequência do caráter atemporal da língua: a sincronia (em grego, “sun” é junção, do tempo eterno) pela qual permanece suspenso o tesouro dos significantes.
Assim, compondo com palavras na linha da fala, a atenção pretende uma antecipação do sentido que nos mantém na expectativa do que está sendo dito (avant cup) e uma significação que só se consegue posteriormente (après cup). O dualismo temporal indicado nos permite ainda descompor o que sucede na fala quando diacronicamente se realizam operações psíquicas distintas, uma de seleção e outra de combinação de significantes. Equivale a dizer, na operação de seleção, que a escolha das palavras que proferimos implicou enlaces em que a posição das palavras será mais ou menos determinada e nunca situada arbitrariamente, e esta operação é possível por uma “dimensão sintagmática” (Saussure, 1916/2014, p. 172).
Por exemplo: Dizemos “o cachorro bravo” e não “bravo cachorro o”, ou seja, a ordem é relativamente flexível e podemos antecipar um adjetivo a um substantivo, mas não um substantivo ao artigo, e quando a ordem é alterada fora do normatizado, uma suspensão do entendimento emerge como equívoco. Por outro lado, constatamos que o falante terá uma série de possibilidades de escolha na hora de selecionar um termo para construir alguma frase, e surgirão palavras como sinônimos do tesouro sempre disponível. Neste aspecto reconhecemos “a dimensão associativa” (Saussure, 1916/2014, p. 174), a que se estende como uma rede feita de termos, que pode estar tecida pela sonoridade, pela significação, pela família de palavras, ou tantos laços associativos que podem ser nomeados por tipos de semelhanças.
Quem fala regularmente mantém sua atenção para se equilibrar no desfiladeiro do significante, e, ao menos enquanto fala, mesmo que operando com a rede de modo dinâmico, sustenta-se num sentido do qual é responsável pela coerência gramatical. Já quem escuta, diferente do falante, segue a linha temporal do significante e também se suspende voluntariamente em mais de uma dimensão dessa rede. Nesse sentido um bom ouvinte aspira entregar-se à sincronia quando pretende aumentar a abertura à rede de paradigmas, ainda que fique atendendo a linha do sintagma. Ao escutar atendemos naturalmente:
· às leis da gramática e nos advertimos que as alterações podem indicar alguma desordem,
· por outro lado valorizamos os ditos numa abertura a diversas significações,
· e a insistência dos fonemas são indicativos tão importantes como as palavras formadas. Assim, enquanto,
· a fala é um exercício individual da língua (Saussure, 1916/2014, p. 45),
· a escuta, por ficar sempre à espera do outro, pressupõe dependência,
· é participativa partindo do princípio de situar-se no tempo do outro e secundária no processo de operação da linguagem.
Quando Lacan retomou de Saussure o signo linguístico bipartido, reformulou-o representando S/s, e nessa proposta traz para a psicanálise a formalização da qual Freud tinha se aproximado com sua “metapsicologia” ao distinguir a representação - coisa da representação - palavra (Freud, 1915/2006, p. 206), no entanto o interesse da fórmula lacaniana está na neutralidade que evoca produzindo consequências clínicas. O significante em Lacan se distingue do proposto por Saussure, como o observaram Vicenzi (2009) e Arrivé (2001), autores que abordaram a relação entre o signo para a linguística e o significante para a psicanálise.
Na proposta original de signo linguístico, foram estimadas suas “duas caras, significado e significante”, como as páginas de uma folha (Saussure,1916/2014, p. 159), considerando-as como uma unidade na qual ambas as faces participam do mesmo valor. Já Lacan desenha o significante sobre o significado ressaltando a separação por uma barra resistente à significação, e distingue duas ordens na qual o significado se desliza por baixo do significante, indicando a primazia deste com o S maiúsculo, aí onde a escuta se materializa no som.
Quando Freud estudou o psiquismo pelas manifestações da clínica, deparou-se com o relato do sonho e o considerou um ato psíquico com um sistema implícito trabalhando para sua formação (Freud, 1900/2006, p. 56). Por essa via régia para o estudo do inconsciente deveu considerar uma nova normativa subvertendo a gramática. As leis da lógica tradicional que sustentam o conhecimento foram um limite para prosseguir o entendimento, e a formação de sonhos como a dos sintomas era um enigma ao qual precisava responder. Nesse contexto a cena do sonho, composta por imagens e palavras que se misturam - “um barco no telhado, […] uma letra solta do alfabeto… um homem correndo, com a cabeça misteriosamente desaparecida” (Freud, 1900/2006, p. 303) -, se apresentou para ele como uma formação pictográfica, “meio palavra, meio imagem de coisa”. A desfiguração tinha princípios, sendo estes a condensação e o deslocamento. Como as partículas de água se condensam nas nuvens antes da precipitação, também as representações psíquicas são plausíveis de tal junção, resultando na elaboração onírica como “uma massa dessas estruturas compostas” (Freud 1900/2006, p. 350).
Para que uma condensação seja possível, temos um movimento de intensidade que permite inicialmente a desfiguração, e logo estas representações se agrupam, configurando novas figuras compostas. Neste sentido, toda condensação implica previamente um deslocamento da magnitude das partes. O deslocamento é proposto por Freud como um processo parcial e anterior à condensação, em que se “despoja os elementos com alto valor psíquico de sua intensidade, […] e cria a partir de elementos de baixo valor psíquico, novos valores. […] assim sendo ocorrem uma transferência e deslocamento de intensidades psíquicas” (Freud, 1900/2006, p. 333, grifo do autor).
Da
forma como Freud utilizou algumas imagens para figurar o psiquismo, também o linguista
russo Roman Jakobson no capítulo “Dois aspectos da linguagem, dois tipos
de afasia”, do livro Linguística e Comunicação (1935/1969),
ao estudar as anomalias da fala, identificou que estas podem se diferenciar por
classes de deficiências, correspondendo a dois polos da linguagem. Sendo um
destes polos de seleção e outro de combinação, nomeou-os respectivamente de metonímico
e metafórico. Num enlace equivalente ao de Freud e ao de Jakobson, ao
escutar desejos divergentes numa superposição de significantes, Lacan
reconheceu a possibilidade de equivalência entre a formação de sintoma e a
produção de uma metáfora, e para exemplificar nos apresenta:
“O amor é um seixo rindo ao sol” (Lacan,
1957/1995, p. 512), como metáfora do altruísmo narcísico.
No instante em que aparece a centelha criadora ou a instalação de um sintoma, um significante irrompe no lugar de outro, no lugar daquele que não aparece na cadeia significante, e traz para quem escuta a interrogação que, na clínica, será reposicionada para o paciente desde o discurso do analista. A propriedade comutativa presente na linguagem é a que opera na hora da seleção ou troca de uma palavra e, sendo o sujeito afetado por diversas cadeias significantes, pode acontecer o momento de invenção como um múltiplo cruzamento numa vaga significante. Lacan assim nos indicou no instante poético a precipitação de sentido que se produz no “não senso” (ou no mínimo como suspenção de sentido), pela transposição da barra do signo, quando o novo significante se carrega de valor.
A outra figura retórica que apresenta uma ordem psíquica nas formulações de Jakobson e Lacan é a metonímia. A figura que toma uma parte, uma porção, algo com o qual se pode dar continuidade e passagem de uma ideia a outra e assim produzir um deslocamento de sentido. Quando dizemos “tomamos uma garrafa” não duvidamos que o bebido foi o conteúdo, a “quantidade” de conteúdo fica indicada “metonimicamente” na expressão. Observamos que na expressão tem ênfase um deslocamento como conexão e não substituição. Na medida em que se produz mudança por esta conexão de um significante com outro significante, o que chega mostrando uma modificação, opera tomando a parte pelo todo, sendo a supressão de uma dessas partes que produz o efeito de continuidade da falta.
A diferença da metáfora com a metonímia está em que esta se dá por conexão de palavra a palavra, e não por permutabilidade, enquanto a metáfora, em lugar de continuidade, atravessa a barra e se enche de sentido pelo próprio efeito de substituição. Prestando atenção nas figuras retóricas comprovamos que correspondem a formações do inconsciente e, muitos dos instantes criativos, patológicos ou não, operam por substituição. Deste modo, chistes, sintomas, sonhos, equívocos podem ser escutados além da surpresa imediata que provocam, com a condição de que se reconheça neles a propriedade de estarem constituídos por cadeias associativas que trabalham engenhosamente no decorrer de uma enunciação. Estas cadeias se formam por ligação, de significante a significante, e nessa corrente ilimitada podemos calcular que uma falta constitutiva garante o movimento. Enquanto "está disposto o analista a escutar" o desejo pela via metonímica, que insiste em apresentar a cada momento que o objeto faz causa, um movimento, a figura retórica varia e relança o sujeito ao polo oposto, balançando das explicações ilimitadas sobre o sintoma ao sofrimento enigmático que resiste às explicações.
Para favorecer a ação da escuta, em "O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise", Lacan situou a formação do analista num ideal no qual o ego estaria ausente, virtualmente ausente, porque não existe sujeito sem ego, porém ele visava obter da análise um sujeito afetado do outro lado do muro imaginário da linguagem (Lacan, 1955/2010, p. 334). A presença do analista se dá inicialmente, desde que ele forma parte da comunidade dos falantes, está na linguagem, mas sendo seu ego favorável a uma condição de ausência, possibilita não agir especularmente, mas como um espelho vazio. Quanto mais "o analista sustentar sua escuta, aceitando acolher esse vazio de sentido, abstendo-se de entender, mais a fala terá o ritmo e os percursos dos desejos de quem associa livremente". Essa atitude reservada do analista também é índice do seu desejo de acompanhar pelas vias dos significantes o movimento que interroga o sintoma ou outras formações enigmáticas que demandem uma análise.
Comportando-se diferente do erudito que sabe sobre determinado tema e se encontra no direito de interrogar, o analista manteria uma relação estável nesse processo de comunicação sem exibir conhecimentos nem tentar cercar a verdade com inquéritos, sua essência teoricamente estaria num discurso sem palavras. Em “O avesso da psicanálise”, trata-se de garantir com presença (Lacan, 1969/2007, p. 11) um modo de sustentar os significantes por vir, a partir de uma estrutura prévia, num discurso sem palavras que se monta no desejo, indicando seu movimento. A mínima diferença importa, mas para se dar conta deve o entendimento ceder espaço à escuta, assim um traço particular da escuta psicanalítica vai se ligando ao som, à materialidade da língua, estruturando a psicologia.
Às conclusões, dos textos consultados me permitiram reconhecer os traços de uma escuta singular que espero encontrar na escuta analítica, a qual se abstém de críticas, de oferecer opiniões, de procurar benevolências terapêuticas e lições educativas. No mesmo sentido, a partir da segunda metade do século passado, os psicanalistas definiram sua especificidade, até delimitar a singularidade de seu discurso, como discurso sem palavras que evoca o desejo. Estas características se definem quando se abordam textos antigos e mostram que, no século III a.C., "o escutar se vinculou ao acolhimento de necessidades e afetos de desamparo, ao acompanhar a busca, sustentar interrogações, a partir do postulado inicial de não interferir".
Escutar também se vinculou, de modo especial, com a língua, esperando dela elos associativos, distantes dos raciocínios precisos que ordenaram a lógica nos séculos seguintes. A esta escuta antiga foi possível quando a fala conseguiu aproveitar sua flexibilidade de sentidos partindo da abstinência de verdades universais e de saber. Identifico na Antiguidade um traço especial de escuta, que hoje podemos reconhecer no humor de Aristófanes, que Freud recuperou na fala de seus pacientes e na atitude dos analistas com disposição para escutar. Com inúmeras diferenças entre 24 séculos, devemos estar cientes de que seria um anacronismo extremo pensar uma análise do psiquismo no século III a.C. como se fosse uma psicanálise, ou colocar os gregos como origem da psicanálise contemporânea.
Nesse sentido, somente encontro traços nos textos antigos que se reconstituem ao disponibilizar um dispositivo de escuta moderno, que, como Freud, também partiu da abstinência de críticas e da associação de ideias. Independente de qual seja a língua, e em qual momento histórico seja analisada, ela é constituinte da subjetividade e por ela transitam as possibilidades de fala e de escuta. Nela insistem posições de discurso que mantêm sua dinâmica, sendo identificáveis nestes casos por não precisar se erguer como um agente que sabe o que deve ser feito; e pela escuta, distinguir em silêncio como encorajar o desejo.
Desdobra-se,
assim, um discurso, acompanhando de modo sincrônico os traços que na história
nos permitem identificar o ofício de escutar: Lévi-Strauss (1955/1970, p.
231) cunhou o termo “mitema”, e nele indicou uma unidade semântica
que forma parte da história contada, que se repete e delimita seu valor por
oposição das diferenças. Neste sentido Lacan (1956/1995, p. 260)
alertou que:
“a formalização do mito isola elementos
cujo funcionamento estrutural se repete sendo “comparável - sem, no entanto,
lhe ser idêntico - àquele isolado pelo estudo da linguística”.
No caso da psicanálise, essas unidades também são reconhecidas como mitemas, sendo adotadas para acompanhar o entendimento do caso clínico do pequeno Hans (Lacan, 1956/1995, p. 262). Não é meu propósito situar o método da psicanálise como sendo similar ao estruturalista, somente estou aproveitando o agrupamento e a diferenciação de elementos para reconhecer dados equivalentes em diferentes tempos.
Aqui no Brasil, somente no ano de 1962, João Goulart, o Presidente da República na época, sancionou a Lei 4.119, que tornou a psicologia, de direito, uma profissão. Isso ocorreu após a mobilização e determinação de diversos profissionais da área na época, tornando o dia 27 de agosto, o Dia do Psicólogo, no Brasil. A importância da psicologia tem sido demonstrada no decorrer do tempo, por exemplo, nos esportes, onde uma boa preparação emocional é tão importante quanto à preparação física. Evolui cada vez mais com o passar do tempo conforme as necessidades e demandas da sociedade, adaptando seu objeto de estudo em detrimento às constantes mudanças e o aparecimento de novos paradigmas.
A psicologia , dentre outras, está dedicada a compreender processos como percepção, memória, raciocínio, que influenciam qualquer tipo de comportamento humano, o que no campo dessa ciência é discriminado como “psicologia básica”, por isso é muito ampla. A área mais conhecida da psicologia é:
· a clínica, que visa ajudar a resolver questões emocionais e comportamento para melhorar a qualidade de vida das pessoas.
· A psicologia social e a comunitária, tem objetivos semelhantes aos da clínica, mas sua abordagem é macro e trabalha com grandes populações. Outras áreas de atuação:
· Psicologia educacional: atua com as questões relacionadas à aprendizagem e de desenvolvimento em instituições de ensino;
· Psicologia das organizações: aplica teorias desenvolvidas por psicologia social especificamente para profissionais e organizações;
· Psicologia forense: concentra-se na avaliação psicológica como suporte para processos judiciais;
· Psicologia esportiva: visa melhorar o desempenho atlético.
Todas
as pessoas são diferentes, e todas possuem desafios distintos, mas é certo que
em algumas fases, ou com algumas situações, pode repetir a forma na qual costumamos reagir!
Roberto Costa Ferreira, 27 de Agosto de 2022.
PROFESSOR - PSICANALISTA – PESQUISADOR
UNIFESP – Universidade
Federal São Paulo / SP
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