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sexta-feira, 13 de outubro de 2023

ESTOU de LUTO! - DIA MUNDIAL DO ESCRITOR - Então, vivo este tempo. O tempo de Manuel Bandeira!

13 de outubro de 1968, Botafogo, Rio de Janeiro, faleceu Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho.
Um poeta, crítico literário  e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro.


Vivo este luto, exatamente no dia que comemoro o tempo do Escritor - Dia Mundial do Escritor - isto me consola, pois que, lembro nesta oportunidade do Salmos 119:50 - que a tua palavra me vivifica. O que me consola na minha angústia é isto: que a tua palavra me vivifica!

Aqueles que amamos nunca partem de dentro de nós, mesmo que a morte os leve para longe

Remonta considerar que quando alguém falece, é muito usual utilizarmos a expressão “meus pêsames”. Tal expressão - Pêsames - é um substantivo que expressa o sentimento de pesar, compaixão e dor em relação à morte de alguém. A sua origem está associada a forma verbal “pesa” associada ao pronome “me” (formando, então, pesa-me). Antigamente, a expressão “pesa-me” era usada para definir situações que causavam dor e desgosto. Por exemplo, na frase “pesa-me muito vê-lo sofrer”. De tanto usar “pesa-me”, foi surgindo, aos poucos, a palavra pêsame. Hoje, é mais comum a usarmos no plural, pêsames. Porém, a ideia permanece semelhante. Afinal, sentimos dor e pesar quando alguém falece ...

É o que ocorreu, visto que,  em 13 de outubro de 1968, Botafogo, no Rio de Janeiro, faleceu Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho. Um poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro. Considerado como parte da geração de 1922 do modernismo no Brasil, seu poema "Os Sapos" foi o abre-alas da Semana de Arte Moderna.

Resumidamente, temos que, ao longo de sua carreira, Manuel Bandeira escreveu vários poemas que podem ser considerados “poéticas”, ou seja, eles tratam do “fazer poesia”, ora dizendo para que a poesia serve, ora dizendo como ela deve ser. Este trabalho em texto apresenta uma análise de um desses poemas – “Desencanto” –  sob a perspectiva da semiótica francesa. E por fim um último - O Último Poema. No primeiro, especial atenção foi dada às condicionantes: 

·         organização do plano da expressão, 

·         à aspectualidade e à tensividade no poema. 

Em 19 de abril de 2023 Manuel Bandeira faria 137 anos. Bandeira passou a vida num adiamento da morte devido à tuberculose, mas só morre aos 82 anos. na verdade, ele foi vítima da ironia. Quanto a este texto, aqui propus uma intromissão, mas me mantendo atento ao poema; deixando-me por ele ser atravessado a fim de que em meu corpo a palavra fizesse mais que cama ou habitação (se possível for haver mais que isso). Ser cavalo não do poeta, mas do poema; e assim deixar que as imagens me (nos) conduzisse(m) para algum tipo de destino possível.

Pois bem, ele partiu ... Um último tempo para o que importa e principalmente para as coisas sem importância. O ávido inútil, incompreensível estado de tudo que se move. olhar para um poema e dizer: acabou. Encerrar as mãos como se escrever fosse seu delírio mais duradouro. No extremo instante, encontrasse a fenda de cujo corte extraviassem as contendas duma vida ordinária. Não há mais verso, imagem, fôlego. o ritmo andante enuncia a paragem no tempo controverso das sutilezas. Num recorte onde o definitivo poema não finda uma poética, e sim a restabelece ao contexto das ficcionais despedidas, Manuel Bandeira encena a melancolia no adiamento de sua ida … para a qual nunca foi, na verdade. Ei-lo aqui, presente, sempre!

De tal sorte que, em breve Análise semiótica de "Desencanto", produzido anteriormente - 1912 - apresento agora, de Manuel Bandeira que, pertencente ao gênero lírico, pois apresenta um eu lírico expressando suas emoções, ideias, há a subjetividade como mostram os verbos e pronomes em primeira pessoa, depreendendo do livro de estreia de Manuel BandeiraA Cinza das Horas (1917) – que é repleto de poemas de um lirismo melancólico e que remetem a temas como a espera da morte, a frustração, a resignação de quem espera o fim, o sofrimento, a angústia, a tristeza, etc.

Assim, o poema que lembro neste momento foi publicado em tal livro e não é diferente. “Desencanto” é um metapoema que descreve o ato de fazer poesia como uma espécie de “válvula de escape”, como um desabafo de um ser que sofre e espera a morte. Desse modo, ele pode ser considerado uma primeira “poética” de Manuel Bandeira, que descreve para que a poesia serve. Minha curta análise tem por objetivo explicitar como esta relação da poesia com o sofrimento está constituída neste texto e demonstrar os recursos utilizados na construção do sentido.

Desencanto

Eu faço versos como quem chora

De desalento… de desencanto…

Fecha o meu livro, se por agora

Não tens motivo nenhum de pranto.

 

Meu verso é sangue. Volúpia ardente…

Tristeza esparsa… remorso vão…

Dói-me nas veias. Amargo e quente,

Cai, gota a gota, do coração.

 

E nestes versos de angústia rouca,

Assim dos lábios a vida corre,

Deixando um acre sabor na boca.

— Eu faço versos como quem morre.

(Teresópolis, 1912) - [A cinza das horas, 1917]

Nessas breves considerações que fiz de “Desencanto” como uma poética, vai ao encontro do que diz o crítico Davi Arrigucci Jr. (2003:132-133) quando afirma que a poesia de Bandeira é:

“uma experiência da ameaça de morte. Esta que é uma condição geral de toda existência humana, se fez, no seu caso, um risco próximo e permanente (...). O rapaz que só fazia versos por divertimento ou brincadeira, de repente, diante do ócio obrigatório, do sentimento de vazio e tédio, começa a fazê-los por necessidade, por fatalidade, em resposta à circunstância terrível e inevitável (...). Nascendo junto com a circunstância adversa, a poesia é então percebida como um desabafo momentâneo (...)”.

Nessa sintonia, onde percebe-se o "desabafo", temos então, publicado em Libertinagem  (1930), “O último poema”  que carrega a potência do sarcasmo, da sagacidade que compôs a poética bandeiriana, múltipla nos modos de composição. Evidentemente, é um poema que em vez de encerrar uma trajetória, continua abrindo caminhos, tal qual este aqui nascido numa tentativa de incorporação poemática.

O último poema

Assim eu quereria meu último poema

Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais

Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas

Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume

A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos

A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.

O drama de se pensar nos atos finais: aceno, beijo, poema, abraço, cena. A hora mais que hora de algo que se chamaria representação. Mas a representação não acontece no poema, uma vez que este se realiza como realidade fundada na leitura do leitor, da leitora. O poema vigora como tempo das ocasiões tardias ou prematuras, fugidias e ratificantes de seu intenso presente. Poema que é agora ou nunca, último e primeiro. Quereria eu (ou não) que fosse este meu decisivo escrito. Quereria apenas a vontade de ser naquilo que se tem aos poucos, ou na torrencial referência dos sujeitos. Resistisse ainda a melancólica travessia para o estado derradeiro do nada, quando possível.

Que fosse terno o poema, ainda que voraz na aversão por hiatos. Presença nascida na despedida toante da última palavra dita, da última boca no ventre mágico do verso. Quem me dera eu ser o terminal poeta cuja desolação me levasse para a pasárgada. Lá fosse rei e amigo dos que nascem a cada instante. Seria tão mais fácil construir um bom dia se o encontro não fosse afoito, e caso perguntasse na exata medida da curiosidade: Do que são feitas as coisas mais simples e menos intencionais?

Quando o choro fosse noite, amanhecesse encharcado pela secura das lágrimas – ardentes no arranjo vazio dos soluços. O mar para fora de sua salinidade contorna o relevo do peito no arfar do meu nome ao ser içado no mais forte fôlego: Bandeira. Poema, que último fosse o gesto de sua taquicardia inesperada e alcançasse o extremo calor na ardência tardia de sua proclamação. Das almas fossem feitas brisas ante a tempestade que se anunciava, até tomarem gosto pela tragédia e levarem consigo os crentes do paraíso.

Poema, decisivo em seu fim, arrumaria com cuidado sobre o peito as flores gastas de tanto delas se retirar o olfato; belas, dada a dinâmica oracular de suas cores. Reclamaria o cheiro por um triz distanciado da estrutura com a qual se arrumam a ilusão dos destinos. Passarei a crer que nesse findo encalço se manterão as glórias enviadas ao despautério de nossa despedida e, assim, despertar o que atende pela ausência da própria escansão.

Tivesse ainda a pureza da chama para desfazer a alotropia do carbono e reinventar a estrutura mais límpida dos diamantes. Fizesse a lua descer da noite sem tocar em estrela alguma, a fim de trazer para perto a luta com seu dragão tatuado. Queimaria com fogo forte a letra impressa e disso faria um manifesto em que sapos se refeririam ao adereço primal da semana na qual foram tomadas as escadarias da vanguarda. Ao mesmo tempo, ficaria ciente de que ali se faria novamente um mundo. Embora não fosse meu corpo presente, a presença do poema ora último talvez primeiro responde pela matéria de realidade incitada enquanto ainda houver quem me leia silente ou ferozmente.

Desfrutasse finalmente, poema, dos que morrem por si próprios apaixonadamente. Sem explicação é a beleza suicida dos versos, nascidos com a partida duma voz futuro-pretérita: assim eu quereria meu último poema. Que tivesse em cada verso o lampejo da frase interrompida. O anonimato dos nomes cerrado em lábios calados desde o estalo da irrevogável imagem proferida. Quereria assim meu poema, último na descendência pela cesura confortável. A pausa libertina na respiração das palavras, sua passagem, o intervalo findo como a estrela da manhã.

Manuel Bandeira encena a melancolia no adiamento de sua ida… Para a qual nunca foi, na verdade!

Roberto Costa Ferreira, 13 de Outubro 2023.

HILASA – Instituto de História, Letras e Artes

Santo Amaro / São Paulo / SP.






 


 

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