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sábado, 6 de novembro de 2021

Dia Nacional da Cultura - Educação não é privilégio, nem prêmio!

 


O Dia da Cultura é um feriado nacional que ocorre anualmente no Japão, em 3 de novembro, com o propósito de promover a cultura, as artes e o empenho acadêmico. Foi originalmente celebrado como o Aniversário do Imperador, porque Meiji nasceu em 3 de novembro, e passou a ser conhecido como o Dia da Cultura com a morte do Imperador, em 1912. Com o anúncio oficial da constituição japonesa pós-guerra, em 3 de novembro de 1946, o Dia da Cultura ganhou um significado adicional, tornando-se um dia para o povo japonês promover os valores adotados na constituição pós-guerra. O dia que a constituição foi oficialmente adotada tem seu próprio feriado também, chamado Dia Memorial da Constituição.

Aqui no Brasil, o dia 5 de novembro foi escolhido como o Dia Nacional da Cultura em homenagem a Rui Barbosa, jurista, jornalista, político, diplomata, ensaísta e orador. Nascido em Salvador, Bahia, em 5 de novembro de 1849, Rui Barbosa desempenhou importante papel político e cultural no Brasil. Já em 15 de maio de 1970, a lei nº 5.579 instituiu o "Dia da Cultura e da Ciência", comemorado a 5 de novembro de cada ano, como homenagem a data natalícia de figuras exponenciais das letras e das ciências, no Brasil e no mundo. A data teve como inspiração o Conselheiro Rui Barbosa.

Cultura é um conceito amplo que representa o conjunto de tradições, crenças e costumes de determinado grupo social, da aprendizagem social. Essa dinâmica faz dela uma poderosa ferramenta para a sobrevivência humana e tornou-se o foco central da antropologia desde os estudos do britânico Edward Tylor (1832-1917). Segundo ele:

"A cultura é todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade”.

A cultura brasileira resulta da mistura de raças e etnias que constituem o País desde o descobrimento, tendo sito, tal diversidade cultural brasileira, influenciada por quatro grandes grupos, quais sejam: 

  • Colonos portugueses;
  • Os índios que já viviam antes da chegada de Pedro Álvares Cabral (1467-1520);
  • Os negros africanos que resultaram aqui escravizados;
  • Os europeus que chegaram principalmente ao fim do período de exploração da mão de obra não remunerada.

Diferente da maioria dos países que passaram pelo processo de colonização, o Brasil é marcado pela miscigenação, condição que influencia diretamente na cultura e, a língua portuguesa, que é um importante elemento da unidade nacional, também está entre os pontos de destaque da cultura brasileira.

Quando se trata de cultura e educação, podemos dizer que são estes fenômenos intrinsecamente ligados, a cultura e a educação, juntas tornam-se elementos socializadores, capazes de modificar a forma de pensar dos educandos e dos educadores; quando adotamos a cultura como uma aliada no processo de ensino-aprendizagem.

“O acesso à cultura potencializa a aprendizagem e é uma ferramenta muito potente. Ela nos transposta desse lugar que estamos acostumados, seja ele qual for”.

Mais recentemente vem se discutindo, não a largas passadas mas, talvez, inevitavelmente,  a incorporação da cultura no processo de ensino-aprendizagem, momento que alguns educadores e movimentos sociais, lutam para que suas culturas sejam legitimadas como essências e coparticipante no processo de ensino, com relação à temática. BOURDIEU afirma que:

"a cultura é o conteúdo substancial da educação, sua fonte e sua justificação última [...] uma não pode ser pensada sem a outra",

Desse modo, embasados na ideia de que a cultura é um elemento que nutre todo o processo educacional e que tem um papel de suma importância na formação de um indivíduo crítico e socializado. O reconhecimento da multiculturalidade da sociedade leva a constatação da diversidade de raízes culturais, postas anteriormente, que fazem parte de um contexto educativo. Nesse sentido autores que enfatizam a relação existente entre escola e cultura, nos instiga a buscar uma melhor compreensão acerca da importância da cultura no processo de aprendizagem e nas práticas pedagógicas, onde a escola é defendida como uma entidade socializadora que deve incorporar as diversas culturas, proporcionando um ambiente sociável.

Darcy Ribeiro (1972): afirma que:

“[...] cultura é a herança social de uma comunidade humana, representada pelo acervo coparticipado de modos padronizados de adaptação à natureza para o provimento de substâncias, de normas e instituições reguladoras das reações sociais e de corpos de saber, de valores e de crenças com que explicam sua experiência, exprimem sua criatividade artística e se motivam para ação”. 

Ao que se observa, Darcy Ribeiro converge na ideia de que embora a cultura seja um produto da ação humana, ela é regulada pelas instituições de modo que se lapida, de modo justo e perfeito, a ideia a ser manifestada segundo os interesses ou valores de crenças.

Anteriormente, Anísio Spínola Teixeira, intelectual, jurista e educador, nascido em 1900, na Bahia,  e defensor da escola pública no Brasil, foi um dos  signatários do Manifesto da Escola Nova divulgado em 1932, defendia a universalização da escola pública, gratuita e sem vínculo com nenhuma religião. Na ação transformadora em que se empenhou tal educador – concentrada na educação pública – a preocupação com a cultura sempre esteve presente em seu pensamento, materializando-se em diversas realizações.

Destaque-se a excepcionalidade do filósofo-educador para a observação dos aspectos culturais nas dimensões educacionais, em sentido amplo, ao exemplo para com a implantação de bibliotecas nas escolas primárias, e ainda na inauguração de escolas em que os alunos tinham aulas em um dos turnos e, no outro, desenvolviam atividades culturais, de formação da cidadania, trabalho e práticas esportivas.  Recentemente, determinada especialista disse:

“Alfabetização é uma das maiores invenções da espécie humana”. Além de útil é tão poderosa que transforma nossas mentes: “Ler literalmente muda o cérebro”.

Em sua primeira edição, de 1957, 14 anos antes de sua morte que ocorreria no Rio de Janeiro em 1971, a publicação de "Educação não é privilégio" reunia duas conferências: a primeira, sob o mesmo título, proferida na Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, em 1953, e a segunda, "A Escola pública, universal e gratuita", pronunciada em setembro de 1956, no Primeiro Congresso Estadual de Educação, em Ribeirão Preto - São Paulo.

A referida edição traz também um anexo: "A Associação Brasileira de Educação e o ensino público". Além desta, foram publicadas mais quatro edições. Assim, em 1957 Anísio Teixeira publicou seu texto mais significativo com o título acima referido: ”Educação não é privilégio”, leitura praticamente obrigatória para qualquer professor brasileiro preocupado com seu próprio ofício. O título é auto elucidativo: todos tem direito à instrução básica. Estendendo um pouco mais aquela ideia, podemos concluir e afirmar que ”Educação não é privilégio, nem prêmio”!

Por mais de três milênios o mundo cultivou a crença de que a instrução era uma obrigação que as famílias tinham para com seus filhos. O dispêndio era grande e os pais mais pobres garantiam apenas um mínimo, no caso dos que tinham a sorte de poder pelo menos alfabetizar suas crianças. Em 1772 o mundo passou por uma grande revolução conceitual: o Marquês de Pombal implantou o ensino público gratuito, como substituição ao sistema escolar dos jesuítas.

Em 1794, Condorcet – Marques de Condorcet: Marie Jean Antoine de Caritat, filósofo, matemático e político revolucionário – à luz da Revolução Francesa na escola e a menos de três anos depois da tomada da Bastilha, precisamente em 14 de Julho de 1789, a Assembleia Nacional, que havia sido investida de poderes constituintes, recebeu um projeto de organização geral da instrução pública elaborado pelo dito marques (1743-1794).

Um dos pioneiros na defesa de um ensino igual para homens e mulheres e também no voto feminino, que a maioria dos revolucionários de então não aceitavam, em discursos e escritos argumentava contra a discriminação a protestantes e judeus e pregava o fim da escravidão e o direito de cidadania dos negros, teorizou sobre essa novidade do ensino público universal (“a igualdade de instrução”) em seu livro “Esboço de um quadro histórico do progresso do espirito humano”.

E por que a educação não é “privilégio, nem prêmio”? Por muitos motivos. O primeiro é que não se recebe educação como se fosse um presente, empacotado. Educação só existe quando o agente principal, o aluno, esforça-se para adquiri-la. O segundo motivo é que o aprendizado não é um bem pessoal. O educando é objeto de investimento, o investimento mais importante que a sociedade pode fazer. Quando praticamos educar os jovens de um município, estamos elevando esse município, não os jovens isoladamente!

A confusão que se estabelece quanto a ser a educação um ganho individual vem do fato de que o indivíduo mais instruído está qualificado para receber remuneração maior, arcando com maiores responsabilidades. Ora, se não existisse a escola, os mais bem aquinhoados seriam os portadores de maior força física, ou os que mostrassem mais habilidades com as armas. Para estes, o investimento seria mínimo, e seria entendido como direito subjetivo. Não é o caso da educação.

Para educar uma geração temos de fazer investimento alto. É um pensamento muito mesquinho imaginar que estamos presenteando pessoas em particular, em lugar de estarmos investindo na sociedade. Educando suficientemente teremos melhores e maiores industrias, melhores artes, melhores resultados científicos, melhores desenvolvimentos tecnológicos e melhores relações políticas. Para quem? Para os educandos? Também, mas muito mais para os demais beneficiários. Portanto, “Educação não é privilégio, nem prêmio” para o indivíduo. É compromisso!

Roberto Costa Ferreira, Novembro de 2021.

PROFESSOR – PSICANALISTA E PESQUISADOR

UNIFESP – UNIVERSIDADE FEDERAL de SÃO PAULO


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