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domingo, 9 de dezembro de 2018

Clarice aniversaria, portanto, inesquecível...!


No dia de hoje ela faleceu – Clarice, 9 de Dezembro – então nascida em 10 de Dezembro. Em determinado tempo, ela transitou por minha vida... Nunca mais a esqueci! Era o ano de 1969, recém-saído do cumprimento do serviço militar, o Exército, eu, um querido discípulo de Paulo Emílio, professor na ECA, Escola de Comunicações e Artes da USP - Universidade de São Paulo, já quase 1970, trabalhando com livros, tinha amigos no curso de Letras na USP, onde um deles frequentava: o Wisnik.

Resolvemos fazer, um grupo de amigos, uma Revista Literária e produzirmos uma grande e significativa entrevista... Conseguimos, marcamos a entrevista e fomos ao Rio de Janeiro de ônibus, para o Bairro do Leme. Intrépidos estudantes tomados por um ardor juvenil, fomos ao apartamento da personagem e, nesse grupo tinham já poetas, escritores e, lá chegando, não sabiam como começar a entrevista, porque ela não se postava como "Grande Escritora". Linda no seu jeito acendia o cigarro e, por entre a fumaça lançava "aquele seu olhar arrasador”, cruzando as pernas propositalmente! Acho que eu era o alvo...

Nada indicava um caminho para a "Grande Entrevista" e a abordagem era incerta. Aquilo tudo me emocionava, descontrolava, nos desarmava... E, depois de algum tempo de conversas estranhas, aleatórias, olhares profundos e abordagens sem destino, descemos para jantar. Uma colega, como se não tivesse lido "Laços de Família", pediu um frango.
Ela, menina meiga e paulistana, nervosa diante daquele "olhar de lince" da Clarice, não conseguia destrinchar o frango, que escapava no prato! Então, a Clarice vendo a cena, disse:

"Desista! A luta é desigual, não insista!"

E este é o resumo... Uma parábola, uma versão irônica, fulminante, algo lacônico!
Escritores, alguns, são assim... Defrontam o mínimo com o máximo! E vou a dois exemplos:
  • A versão Roseana- Guimarães Rosa, no Sertão, quando Riobaldo diz: "Se um dia Deus vier à Terra que venha armado”!

·         Versão Clariciana: "Se um dia Deus vier à Terra haverá silêncio grande... O silêncio é tal que nem o pensamento pensa”!

Residem nestas uma diferença: DEUS! Que no Grande Sertão se confronta com uma grande violência... Onde o mínimo, a bala - um pedacinho de metal - se confronta com um DEUS UNIVERSAL! Obra de escritores interpelantes...

Do outro lado da história, outra personagem vivia um sucesso internacional, com “Antes do Baile Verde” (1970), conhecida na intimidade de Lyginha, que num dado dia recebeu o alerta pessimista da mãe:
Você já entrou para uma escola de homens, vai publicar um livro, agora você não casa mais”!

Previsão ignorada por Lygia e desmentida pela vida. A escritora casou-se duas vezes, teve um filho e é mãe também de 17 livros de contos e romances traduzidos para o espanhol, francês, inglês, russo e outras tantas línguas. 

Incorporando notas antigas, começa a trabalhar em um novo romance inicialmente intitulado “Atrás do pensamento”: monólogo com a vida. O livro, que em fase posterior seria chamado “Objeto gritante”, por fim se definiria como “Água Viva” e sairia sob o amplo gênero “ficção”, diante do entendimento da própria autora de que ultrapassara as classificações convencionais da narrativa literária.

As duas pouco se conheciam... E eu, muito menos. Mero curioso e fuçador. Assim, naquela viagem para a Colômbia, indo à Cali, oportunidade que me meti num congresso: Congresso de La Nueva Narrativa, lá conheci outras pessoas como Loyola, Ana Miranda, e lá estava eu frente a frente, novamente, com Clarice, estando também o Vargas (Mário Vargas Llosa, que na oportunidade não reunia a glória que detém hoje, escritor peruano, agora consagrado internacionalmente, também jornalista, dramaturgo, ensaísta e crítico literário). Foi professor em diversas universidades americanas e europeias, ao longo dos anos, tendo hoje uma vasta produção literária, principalmente romance, entre eles: “Conversa na catedral” e “Tia Julia”.

Então, no estreitamento da conversa em meio ao corredor, a Clarice, lembrando-se de minha passagem ousada pelo Rio de Janeiro, disse à Lygia, tendo ela aquela fala ótima, ucraniana, era uma fala assim: “Lygia, está muito chato aqui dentro, vamos sair.” Assim, nós fomos para o bar e ficamos conversando horas, enquanto lá dentro no Congresso, evidenciava-se “o porquê da palavra, porque não sei o quê e tal”... Então ela, a Clarice disse: “Essa gente é muito cacete. Eles interpretam a gente de uma maneira que eu não entendo”. Então, ficamos conversando e  falávamos muito sobre os problemas, as dificuldades, a discriminação, falando sobre pessoas e elas sobre o homem, sobre os homens, as coisas...

Ela dizia, lembro: “Lygia...”, esta frase eu gostava tanto que às vezes lembro-me e reflito sobre sua real intenção: “Desanuvia a testa e põe um vestido branco!
Mas, enfim, e quando nós saímos desse bar, estavam saindo, coincidentemente, todos da sala, suados, nervosos e meio desencontrados. Já nós, e elas felicíssimas, então Clarice disse:
“Olha a cara deles e olha a cara nossa. Nós estamos bem, fomos tomar os nossos Martini.”

Lygia, na oportunidade disse e, tem hoje uma referência que me impacta, acerca dos amigos e amizades... Assim:
Amigos são importantes... E perdê-los é como parte da memória que se vai”.

São memórias... O Consciente, o Inconsciente e o Pensamento Elástico, através do qual não seguimos as regras, mas as criamos, preservamos e renovamos amigos, produzimos um texto... Criamos “novas ideias"!

Recentemente, reiterou Lygia, a querida Lyginha, que: “O escritor no Brasil fica bom, fica maravilhoso, depois da morte. É necrofilia, é necrofilia!” A Clarice, assim como eu, quando estávamos lá, no Congresso, “ninguém ligava para a Clarice, ninguém ligava para nada, estávamos em Cali (Colômbia), e voltamos. Ela se queixava nas cartas, do silêncio, de tudo isso”! Então ela morreu:
Ah! A necrofilia é a vontade de exaltar o morto, porque o morto não está mais competindo, acho que só pode ser isso”.

Acho que é de Thomás Antonio Gonzaga (1744-1810), poeta e ativista político que participou da Inconfidência Mineira com Tiradentes:
As glórias que vêm tarde já vêm frias”.

As louvações, meu queridos, disse ainda Lygia,
“... têm que vir enquanto a gente tem ouvidos para ouvir e olhos para ver”. Lembrou ainda que, “o polvo no mar se sente perseguido, certo tipo de polvo, ele destila, ele solta uma tinta negra. Eu acho bonito isso, ele solta tinta negra para não ser visto, para fugir, e no meio daquela água escura ele pode desaparecer dos seus caçadores. Nós não temos essa tinta para destilar, nós estamos transparentes. Nós temos que ser transparentes para podermos nos ver. Eu tenho que ver você, porque eu sou escritora. Eu tenho que saber de você. Eu não tenho tinta nenhuma para fugir de você ou para justamente fazer com que você também suma”.

Desse modo, de ti não esqueci, muito querida e inesquecível Clarice Lispector!

Roberto Costa Ferreira, 09 de Dezembro de 2018.

sábado, 17 de novembro de 2018

EDUCAÇÃO - O ARBITRARIO CULTURAL DOMINANTE... E o discurso de Igualdade da Escola – A Violência Simbólica


Em tempos de discussão de projetos e o crescimento da abordagem do tema “Escola sem Partido”, movimento iniciado por cerca de quatorze anos – 2004 – no Rio de Janeiro, inicialmente intitulado Programa Escola sem Partido, cuja principal referência bibliográfica remonta ao livro “Professor não é Educador” - Autor, filósofo Armindo Moreira - cuja tese central do livro é a dissociação entre o ato de EDUCAR e o de INSTRUIR, envolvendo ainda aspectos de doutrinação que, nestas minhas considerações, partindo da compreensão do que é educar, aqui lembrando a Gandhi – Mohandas Karamchand Gandhi, conhecido Mahatma Gandhi - que dizia:

“A verdadeira educação consiste em por a descoberto o melhor de uma pessoa”.

Ainda, em Michelangelo – di Lodovico Buonarroti – pintor, escultor, poeta, etc. quando indagado como tinha conseguido a proeza de execução de magnífico trabalho, tendo inicialmente visto um bloco de pedra e dito: “Ai dentro há um anjo, vou colocá-lo para fora”!  Então, complementando a resposta: “O anjo já estava aí, apenas tirei os excessos que estavam sobrando”. Desbastar a Pedra Bruta é a tônica! E “educar” é isto, paciente e peritamente rarear os maus hábitos, promovendo o relevo das virtudes, até que o “anjo” ecloda. Uma constante tarefa!

Quanto a “instruir”, aquele ato de transmitir conhecimentos, a iniciação, a categoria que mais dúvida sucinta para o desprevenido. No “ensino”, os conteúdos são “saberes teoréticos” e “temáticos”, ao passo que na “instrução” são reunidos “saberes-fazer” (o “savoir-faire” dos franceses ou o “know-how” dos ingleses) e destrezas corporais.

Pensemos então numa imagem para a ação de instruir: “Você tem dificuldades? Eu ajudo”! Pense num pintor a ensinar como se pintam telas a óleo. Quais os conteúdos desta iniciação - instrução? Muito claro que será um saber fazer, uma destreza que o instrutor tenta passar ao aprendiz. Desse modo a significativa diferença entre ambos, reside no “tipo de conteúdo transmitido” tendo o “saber teorético versus o saber fazer”. Compreende-se assim, a oposição entre a TEORIA e a PRÁTICA.

A CULTURA compreende os valores e significados que orientam e dão personalidade ao grupo social. Já CAPITAL CULTURAL é uma metáfora criada por Bourdieu para explicar como a cultura em uma sociedade dividida em classes se transforma numa espécie de moeda que as classes dominantes utilizam para acentuar as diferenças. A Cultura se transforma em instrumento de dominação. Em vista de tal a classe dominante impõe às classes dominadas sua própria cultura dando-lhe um valor incontestável, fazendo com que seja a “cultura boa”.

Bourdieu percebendo esta dinâmica e a batizou de “arbitrário cultural dominante”. Tal ARBITRÁRIO CULTURAL DOMINANTE nada mais é do que “uma cultura que se impõe sobre outra”. Uma das mais importantes contribuições desse pensador para a Educação foi transpor toda essa ideia para dentro da Escola.

A Escola, dissimuladamente, contribui para que essa “cultura dominante” continue sendo transmitida como tal, e dessa forma acaba favorecendo alguns alunos em detrimento de outros. Os desfavorecidos são justamente aqueles alunos que não tiveram contato, através da família, com o Capital Cultural, seja na forma de livro, coisas concretas, seja por não terem tido acesso a lugares e informações facilmente acessíveis para aqueles estudantes mais privilegiados.

Eles, os menos favorecidos, não conseguem dominar os mesmos códigos culturais que a escola valoriza. O aprendizado para eles é muito mais difícil. Bourdieu entende que, assim, a escola marginaliza os alunos das classes populares enquanto privilegia aqueles alunos mais dotados de Capital Cultural. Por isso, o discurso de igualdade que a escola prega não funciona na realidade!

Compreende-se, portanto, que os filhos de pais diplomados, porque tinham esta familiaridade com o universo de um saber que a escola cobrava, logo, tem mais chances. De outro modo,  não é nem pela incapacidade que os menos favorecidos aparentemente reúne, não é que não tem cultura, mas eles não tem a “cultura que a escola demanda”.

A Escola não cobra dos alunos apenas o que foi ensinado. Ela cobra outras habilidades, que são fáceis para um e estranhas para outros. Desse modo, ela acaba enfatizando as diferenças. Os alunos que cresceram em culturas distintas, ou que não possuem um bom Capital da Cultura Dominante se enganam e “pensam que a dificuldade é falta de inteligência”!

Um exemplo dessa “dominação cultural nas escolas” é a escolha das matérias mais importantes e, não sendo difícil perceber que nos currículos, disciplinas tais como Física, Matemática ou História são mais valorizadas do que Desenho ou Educação Física, etc.. Assim a dominação de uma classe sobre outras se mantem.
Pierre Félix Bourdieu, lá atrás, já acreditava haver uma saída para toda essa “violência simbólica” exercida “inconscientemente” pela Escola. Bastava “tornar explicito todo esse comportamento/condicionamento velado da instituição”.  E não sem razão, vez que, esse sociólogo francês (1930 – 2002) dedicou parte significativa de seus mais de quarenta anos de vida acadêmica para os estudos no campo da educação, tendo exercido influência em gerações de intelectuais de diversas áreas, mas principalmente aos que se dedicaram a estudos sobre educação.
Inicialmente, tais estudos estiveram principalmente, concentrados em:
       ·  Demonstrar os mecanismos escolares de reprodução cultural e social e,
       ·  As “estratégias do sistema escolar” para diferentes agentes e grupos sociais.
É de se considerar, merecendo destaque que, o sociólogo “sempre manteve uma concepção pessimista em relação à escola e ao sistema educacional”. Entendia como uma “grande ilusão” afirmar que o sistema escolar é “um facilitador da mobilidade social”, quando na verdade, na escola se demonstra como o ambiente onde todas as diferenças de classes não são atenuadas e assim, coopera com a conservação social.
Nas décadas de 60 e 70 do século passado, Bourdieu se envolveu em uma série de pesquisas de caráter qualitativo e quantitativo sobre a vida cultural, sobre as práticas de lazer e de consumo de cultura entre os europeus, sobretudo, entre os franceses. Dessas experiências de investigação, publica em 1976, uma grande pesquisa intitulada Anatomia do gosto. Mais tarde, essa mesma pesquisa passa a ser objeto do livro intitulado: A distinção – crítica social do julgamento. Em tais trabalhos, ele e uma equipe de pesquisadores tentam explicar e discutir a variação do gosto entre os segmentos sociais, noções que, posteriormente, fundamentam “afirmações sobre a legitimidade das desigualdades sociais e meritocracia”.
Às minhas conclusões, a discussão elencada no parágrafo inicial desta abordagem reduz-se, à média compreensão, conveniente à ordem ideológica, ausentando-se desta a necessária atenção para a gravidade do quadro decadente da Educação no cenário municipal e estadual. Muitas são as interrogações e incertezas quanto ao futuro... Contudo, espero que, partindo desta modesta contribuição, haja não só mais curiosidades em aprofundar a temática, bem como, maior atenção para a mesma.
Roberto Costa Ferreira, 17NOV2018.



domingo, 4 de novembro de 2018

POETA & POESIA – REDESCOBRIR-SE NUM MUNDO SEM...


O autor: Roberto Costa Ferreira

Alguém, um amigo, em meio a Primavera de Outubro rosa, irascível e amargurado, me disse não ter mais graça viver estes tempos, este mundo... O mundo sem poesia! Ou, fazer arte num mundo sem ideal. O mundo em que o ideal já não vigora mais como governando a expressão.
Ouvi e tentei iniciar a justificativa diante de uma situação que se revelou improdutiva. Então restou-me pacientar. Conclui que exporia meu pensar sobre o assunto, que muito me incomodou, através deste recurso... Quem sabe em algum momento ele conhecesse do conteúdo? É importante ressaltar que são duas as perguntas objeto do desenvolvimento:
  • Viver num mundo sem poesia e,
  • O que deve ser a poesia num mundo sem ideal?
É preciso ressaltar que nestas duas perguntas reside uma diferença entre elas, porque, e isso é importante, quando nós pensamos nas respostas possíveis a essas perguntas, que é apenas, digamos assim, uma tentativa imediata de pensar numa resposta possível... Não é ainda a resposta, mas, como toda pergunta implica que há a possibilidade de uma resposta, a primeira possibilidade de responder a essas perguntas terá que ser feita, no meu entender, distinguindo estas duas indagações. Por exemplo:
  • Como se pode viver num mundo sem poesia?
Alguém poderia responder, dizendo simplesmente: Não se pode viver num mundo sem poesia! Logo, essa seria uma resposta que iria naquela direção que aponto, não só depois de Hegel, como, apesar de Hegel... Quer dizer, não há ideal.

"... só a reflexão em si mesmo no seu ser-Outro, é que é o verdadeiro; e não uma unidade originária enquanto tal, ou uma unidade imediata enquanto tal. O verdadeiro é o vir-a-ser de si mesmo, o círculo que pressupõe seu fim como sua meta, que o tem como princípio, e que só é efetivo mediante sua atualização e seu fim."

De certa forma, como não se pode viver num mundo sem poesia, ou "não existe um mundo sem poesia", então, é preciso que a própria noção de ideal seja reformulada para que possa ganhar sentido essa "outra presença da arte", essa outra "presença da poesia", num mundo onde já não comporta o ideal.

Quer dizer, se o Hegel passou por esta "vinculação de arte e ideal" e isto foi superado, logo, melhor compreendendo-o, "a principal recorrência dessa citação está diretamente relacionada com a ideia de obra de arte ou ainda com a ideia da arte como processo resultante de um “fazer espiritual”, ou melhor, de um trabalho do próprio espírito. Em outras palavras, a arte pode ser reconhecida como um dos temas centrais na Fenomenologia do Espírito, desde que não busquemos nela simples referências a obras históricas, ou mesmo uma espécie de fenomenologia da arte, mas sim que reconheçamos a arte como o último e mais elevado estágio do processo de formação e auto reconhecimento implícitos no conceito hegeliano de trabalho".

Então, o mundo sem ideal, se, nele ainda permanece a poesia, é preciso restabelecer, de algum modo, à relação entre “as Belezas: a arte, o ideal, a poesia”. Então, aqui, à segunda pergunta:
  • O que deve ser a poesia num mundo sem ideal?
Para responder a ela, num primeiro momento, é preciso supor, então, que "vivemos num mundo sem ideal" e que, a "poesia, de alguma maneira, existe neste mundo"! Portanto, são duas perguntas diferentes, mas, elas estão vinculadas. Agora, do ponto de vista abstrato, qualquer um de nós pode propor esta questão, qualquer um de nós pode responder a estas duas perguntas e refletir sobre o significado dessas respostas que, rápida e sinteticamente, esbocei aqui. Ainda, é preciso também entender que, a pergunta, a resposta e a reflexão sobre ambas, só pode ser, verdadeiramente, colocada se partirmos do poeta. Ou seja, o poeta que pode constatar, em primeiro lugar, que nós vivemos num mundo sem ideal. Como ele faz isso? Ele faz "subjetivamente". E aí teremos que entender depois, como que:

Esta tal apreensão subjetiva do mundo faz com que o poeta "apreendendo subjetivamente sobre o mundo" sem ideal, aprenda de alguma forma, algo semelhante ao vazio dele mesmo”!

Assim, isto tem tudo a ver com a identidade da poesia, que é, nesse sentido, buscável através de uma intuição subjetiva que é "a intuição do poeta"! Por tal, torna-se importante ressaltar que, embora do ponto de vista abstrato alguém possa fazer esta pergunta, ou assim se expressar, e ela seria uma "colocação apenas teórica", quando o poeta faz, ele e somente ele faz com propriedade, de uma outra forma, porque a partir de si mesmo e através desta apreensão subjetiva de "um vazio num mundo sem ideal" e , de um vazio que diz respeito à própria subjetividade poética, quando ela já não pode mais se expandir num mundo com ideal. Ela tem que se defrontar com um mundo sem ideal!

Então, claro, porque é o poeta que vive nesse mundo sem ideal... É o poeta que vive num mundo em que a poesia poderia não ser possível... E ao colocar a questão desse modo ele se percebe existindo como poeta, mas no plano da ausência da poesia, no plano da ausência de ideal!

Logo, a posição do poeta, e é isto que deve ser profundamente repensado, e Baudelaire é privilegiado nesse sentido, o que vai ser totalmente repensado é isso, ou seja, “o poeta percebe-se existindo como poeta, existindo num mundo em que a ausência do ideal deveria implicar a ausência da poesia”! Assim, essa continuidade que sempre existiu entre o poeta e a poesia, ela tende a ser quebrada. E é bem por tal que "nesse Novo Mundo" o poeta "necessita reinventar a poesia", tanto do ponto de vista do conteúdo dos temas quanto da forma, porque se trata, então de "cantar poeticamente", mas dentro de condições completamente diferentes e, portanto, é algo que diz respeito ao poeta e, portanto, essa pergunta e essa constatação é feita, em primeiro lugar, por ele, o poeta.

Isso é muito importante para que se possa colocar também a questão da identidade do poeta, momento que, ele percebe-se como poeta, mas, como a linha entre o poeta e a poesia está partida, essa linha de continuidade, ele não se identifica mais como "poeta do passado". Então, essa "reinvenção da poesia" e também, "a reinvenção da identidade do poeta e de sua posição nesse mundo distinto" que ele tem, também, que redescobrir!

Aliás, se este meu amigo conhecer deste raciocínio, em algum momento, deverá compreender que, tal qual “a necessária redescoberta do poeta do passado", da nova condição poeta de ser, “urge uma reação rápida: se reinventar”!

Roberto Costa Ferreira, 01NOV2018.

O Poeta Todos os Dias: Para Isabela - Autor: Roberto Costa Ferreira
O Touro - Pintura de Isabela Zanzini em produção escolar - 2018.



quarta-feira, 31 de outubro de 2018

FAKE NEWS e "O Beijo no Asfalto"!




FAKE NEWS na atualidade, já era fato corriqueiro nos tempos de Nelson Rodrigues... Assim, volto no tempo para o tributo: "O Beijo no Asfalto"!

Antes, lembro que Fake News, eleita a palavra do ano pelo dicionário inglês da Editora Collins, mesmo não sendo uma palavra e, sim, "uma expressão", resultou usual no governo Donald Trump, que não inventou a mentira, sequer Fake News, mas fez delas sua linguagem e prática política para justificar e caracterizar veículos de mídia que "atacavam-no", como candidato na época. Sua Secretária de Imprensa, confrontada com fatos irrefutáveis, manteve a sua versão oficial como “verdade alternativa”.

Caracteriza-se, ainda, notícia falsa publicada por veículos de comunicação como se fosse informação real. Esse tipo de texto, em sua maior parte, é feito e divulgado com o objetivo de legitimar um ponto de vista ou prejudicar uma pessoa ou grupo (usualmente figuras públicas).

Há, é claro, outras opções de tradução e considerações, tais como “notícia mentirosa”, “mentira (publicada na imprensa e/ou nas redes sociais)”, “invenção”, “calúnia”, "falácia", esta muito utilizada recentemente por determinados políticos tupiniquins, e, ainda sob o ponto de vista filosófico, no aristotelismo, qualquer enunciado ou raciocínio falso que, entretanto, simula a veracidade; sofisma.

“O adulto não existe. O homem é um menino perene.”

Com base neste enunciado conclui-se que "da marotagem" de Nelson Rodrigues, outros também se locupletaram, como nas minhas memórias:
·         Em 1835 o jornal The New York Sun publicou notícias falsas usando o nome de um astrônomo real e um colega inventado sobre a descoberta de vida na lua. O propósito das notícias foi aumentar as vendas do jornal. No mês seguinte o jornal admitiu que os artigos eram apenas boatos.
·         Ainda, uma contribuição valiosa para a vitória de Eurico Gaspar Dutra na eleição presidencial de 1945 veio de Hugo Borghi, que distribuiu milhares de panfletos acusando o candidato Eduardo Gomes de ter dito:
   
      “Não preciso dos votos dos marmiteiros”.

O que Eduardo pronunciou na verdade, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 19 de novembro (menos de um mês antes do pleito, ocorrido em 2 de dezembro), foi:

"Não necessito dos votos dessa malta de desocupados que apoia o ditador para eleger-me presidente da República".

Entre esses e muitos outros exemplos é possível perceber que esse é um recurso que foi amplamente usado na história, muitas vezes com o propósito de beneficiar alguém ou algum movimento social.

Ora, não seria diferente com Nelson Rodrigues que, tendo produzido sua peça em apenas 21 dias, O Beijo no Asfalto que foi inspirada na história de um repórter do jornal "O Globo", de nome Pereira Rego que, tendo sido atropelado por um “arrasta-sandália”, espécie de ônibus antigo e, ainda no chão de asfalto, o velho jornalista pressentindo a proximidade da morte e, nubladamente, visualizando uma linda jovem que tentava socorrê-lo... Então lhe pediu um beijo. Neste relato temos a interpretação ou representação do real, (verdade subjetiva ou crença), porém, tal realidade está sujeita ao campo das escolhas, isto é, determinamos parte do que consideramos ser um fato, ato ou uma possibilidade, algo adquirido a partir dos sentidos e do conhecimento adquirido.  

Dessa forma, a construção das coisas e as nossas relações dependem de um intrincado contexto. Logo, em "O Beijo no Asfalto", peça escrita pelo teatrólogo, jornalista, romancista, folhetinista e cronista de costumes e de futebol brasileiro, Nelson Rodrigues e encenada pela primeira vez nos palcos em 1961, mereceu a sua verdade (subjetiva), podendo esta estar muito próxima da realidade, porém, dependendo das situações, contextos e premissas de seu pensar a história, cria dúvidas reflexivas... Então, Nelson Rodrigues mudou "um pouquinho" da história.

Na trama do dramaturgo, o atropelado da Praça da Bandeira, agonizante, pede um beijo a Arandir, figura jovem e de coração puro e atormentado. Amado Ribeiro, repórter do “Jornal Última Hora" (retratado por Nelson no folhetim Asfalto Selvagem), presencia o beijo na boca entre os dois homens e, junto com o delegado corrupto Cunha, transforma a história do último desejo em manchete principal e sensacionalista, então dita Fake News, tudo para vender mais jornal!

O sensacionalismo estampado no noticiário muda completamente a história, retratando Arandir como um criminoso que empurrou o amante e depois o beijou. A vida do jovem se transforma num inferno e nem mesmo sua mulher acredita que ele é inocente.

Por trás de uma história aparentemente simples, O Beijo no Asfalto discute questões fundamentais à condição humana, apresentando-se como uma obra aberta a vários significados, falando essencialmente, sobre a dúvida, oportunidade que, partindo de um beijo espontâneo dado por um homem de coração puro, no atropelado, promove um libelo contra a falsidade, ressalta o juízo baseado na aparência e as convicções erradas de parte da sociedade.

Autêntico cenário onde todos se infeccionam, inclusive o próprio Arandir, que passa a duvidar de si mesmo! Nelson Rodrigues não é só atual hoje, vai ser sempre atual porque fala muito de alma, da alma humana, não fala de um tempo, ele fala de um ser, de um ser humano que vai ter sempre suas frustrações, seus desejos, as traições, conspirações, por mais que a gente mude a nossa maneira de ser e que a sociedade mude as suas inquietações.

Roberto Costa Ferreira, 27 de Outubro de 2018.





domingo, 1 de julho de 2018

FATALISMO - TRAGÉDIA


Vídeo: Não é uma Tragédia, de Marcos Piangers e texto de minha autoria.


Eu não sou fatalista. Também não vivo sofrendo, com medo de tudo! Igualmente, "não vivo tragédias nesta vida...Sempre agradeço pela oportunidade  de estar  vivendo este  momento, intensamente, até considerando,  otimistamente,  que neste grupo  que  contém considerável  número  de, e  que  alguns "podem sentir saudades ou lembrar que existo". Quem sabe!


Eu sei "das minhas saudades"... Daqueles que estão ausentes, distantes, dos  que  estão  por  perto, e mesmo nessa condição, "se esquecem de dizer um oi". Eu digo, como agora, no mínimo vários "ois"! Pois que, "vivo um momento eudaimonico"... E viver um "momento eudaimonico" compreende saber que eu estou bem disposto, mesmo por que estou imbuído de poderes divinos! (Mesmo reconhecendo que não os tenho).

A palavra principal para a vivência da felicidade no grego antigo é eudaimonia. Eudaimon é o adjetivo para “feliz”. À felicidade humana, portanto, é conferida uma força espiritual além do controle dos homens... Uma dádiva que depende unicamente dos humores dos deuses. No pensamento grego, um homem feliz (Eudaimon) era aquele favorecido por um bom daimon, o mesmo que ter sorte. Logo, a eudemonia requeria a boa sorte!

Eu "não preciso de dons e sequer procuro os bons humores dos deuses"... Tenho uma força espiritual que me abraça e uma vontade de viver que até cabe dentro de mim. Por tal, tão significativa energia, tal egrégora, sai de mim, dos meus limites e alcança planos superiores "e bate forte na porta dos diversos corações esquecidos".

Esta é a minha mágica, a minha força! Teimosamente, não esqueço de ninguém, mesmo que esquecido, e  vivo esta destinação "agradecendo sempre", até pela existência do silêncio daqueles que "distraidamente esquecem"... Esquecem-me... Esquecem-se!

        Roberto Costa Ferreira, 30Jun2018, 21h50, para WhatsApp

domingo, 17 de junho de 2018

A ESTIMA e O PESAR

Dona Geralda - A Bisa - em sua residencia, recebendo convidados.

Meu bem se foi! Mesmo que distante, sentirei sua voz... E muitos sentirão tal emanação, pois que, não sendo só meu bem, ela difundiu, divulgou e propagou sua razão, a própria essência, dando origem a tantos belos, superiormente belos como fora. Quão brilhante conclusão!

Emana do latim, concretamente do verbo “pensare”, o que se pode traduzir como “estimar”. E "Estima" é bem isso:

'Ter em estimação, sentir prazer por tal presença e curtir em vida física a certeza de ter em conta igualmente no plano da espiritualização'...

É tratar com estimação o privilégio pela oportunidade de ter vivido "daquele sorriso" e ter ouvido daquela "fala mineira franca"... E "guardar carinhosamente um gesto de carinho" que não se restringe apenas ao contato físico, como a um beijo, um abraço, mas também a ações mais abrangentes e simbólicas tal qual "um mimo"... E quanto!

Sentirei saudades. E tal "carinhosa saudade" como demonstração delicada da verdade, esta que sinto é só minha e na justa dimensão, não divido com ninguém. Mas muito e também a sente todos, que "igualmente a tem na exata proporção do querer de seu bem"... De sorte que "todos juntos", agora depois da partida, se somam nesta egrégora de "bem querer, amor e afeição”, cuja delicada demonstração não se divide por nada.

Multiplica-se, elevando-se às alturas, na mais bela e harmônica sinfonia! E tal troca de carinho que esta intenção promove, "tão poderosa arma para a estabilidade da paz interior", é essencial para o equilíbrio emocional daqueles que "por aqui permanecem em saudade", em solidariedade, sendo certo que nos encontraremos "mais adiante, nunca tarde"!

o pesar é um conceito usado sob diversas maneiras. Pode-se inclusive tratar do padecimento que se experimenta face a um doloroso acontecimento.

Menos doloroso é o pesar quando confrontado com a exuberância da vida que se eleva, levanta”... E nessa justa simetria, posição, a querida VOZINHA viajou!

E fiquei eu “na angústia expectante, com meu escondido pranto, no meu isolado ponto, mas solfejando um canto para este vivido encanto”!


Roberto Costa Ferreira, 16Jun2018.


A Bisa - Dna. Geralda - durante comemoração de seu aniversário. 





domingo, 3 de junho de 2018

BANDA de PÍFAROS de CARUARU - COCO de REPENTE





Em Santo Amaro... Quase ao fim da 14ª Edição da Virada Cultural – 20 de Maio último, o Nordeste arretou-se nessa... E eu compareci pra te ver Andrea amiga... Mas também a você Sebastião Biano! Ela, a grande promotora desta rara oportunidade! Ele, 99 anos de idade, tocador da flauta simples, sem chaves e com sete orifícios, último remanescente da formação original, ora presente, da Banda de Pífaros de Caruaru.

Estive num território de conversa rude e afável, cuja impressão reside na velocidade com que costumam se expressar, contrastando com o divertido, cuja atividade lúdica reforça uma ação criadora e, acima de tudo educativa de revitalização cultural, partindo de pessoas que transmitem a cultura do pífaro, ou pífano, pela tradição oral, cujo repertório dispensa partitura, até sendo tocado de ouvido, com a propriedade que lhes é peculiar e de tradição.

Eles, da banda, se apresentaram compostos por dois pífaros no carro-chefe, acompanhados por uma significativa zabumba, triangulo, um afinado tarol, timbalão de chão, tudo nas mãos e vozes de sete seus componentes. E tocaram no palco do Teatro Leopoldo Fróes - Santo Amaro/SP, apresentando-se categoricamente como o grupo de músicos instrumentistas mais tradicional do Brasil, expertos diante de significativo público.

Público que, nesta jornada, transitou pelas dependências do Centro Cultural de Santo Amaro em número superior a mil e trezentas pessoas... Magnífico! E magnífico foi o “coco de repente”, próprio da família dos batuques, a arte genuinamente nordestina, nos improvisos com pandeiros e vozes de Peneira e Pena Branca, cuja dupla de "cantadores" que, ao som enérgico e "batucante" dos pandeiros, montaram versos bastante métricos, rápidos e improvisados. 

E ambos, num tempo sincopado de um compasso binário, num pulso rítmico fundado e muito forte, contagiantes, um tentou a imagem do outro com versos afiados, "atentadores", de respostas rápidas e ao mesmo tempo bem bolados, momento que ambos saíram triunfantes! Nem eu, na plateia, escapei do cantador Peneira que “disse dos meus cabelos brancos e do meu dinheiro no banco”!

Roberto Costa Ferreira, 20 de Maio de 2018,
Biblioteca Prestes Maia - Teatro Paulo Eiró - Santo Amaro.







quarta-feira, 16 de maio de 2018

DIA das MÃES – DOMINGO de MAIO


Neste domingo, 13 de Maio - Dia das Mães - volto para lembrar a importância da data e homenagear as mães que transitam, as que transitaram e as que percorrerão este precioso e iluminado caminho, por esta minha existência, magnificativamente sendo vivida, em cada instante, cada momento, como um presente!

Um presente, pois que, este não é só mais um dia na minha vida... É o único dia que me foi dado: o HOJE foi dado para mim e para as mães presentes... Um presente! É o único presente que vivi, e tenho certeza, todas as mães de minha vida tiveram neste exato momento, o hoje, e a única reação apropriada é a GRATIDÃO!

Gratidão significando que toda a energia recebida, vivida, deve e foi devolvida intensamente. É o ato de reconhecimento de uma pessoa por alguém que colaborou... E colaboramos neste benefício! Esta Gratidão é uma emoção envolvente, e hoje, frequentemente acompanhada por desejos de agradecimentos e reciprocas! É a alegria que surge no recebimento de tantas e brilhantes presenças, todas juntas e reunidas, mesmo distantes, mas muito presentes!

Assim, neste dia, nesta data, vivemos um tempo IMPAR... Abrimos nossos corações para os incríveis presentes que a vida nos proporcionou. Sentimos os perfumes, os olhares, o calor, e fomos abençoados por todas as mães. Algumas, só pelos pensamentos, outras pelas vibrações, pelos toques, até pelas lágrimas de saudades... Só pela simples lembrança da presença não presente!

Mamães! O Dr. Robert Emmons - um professor de psicologia da Universidade da Califórnia - avaliou que "A Gratidão é o "fator esquecido" na pesquisa da felicidade". Aliás, opinião endossada por outro - Dr. Todd Kashdan - adjunto de psicologia da George Mason University e um dos pioneiros da "Ciência da Felicidade". E declarou ainda que, se tivesse de nomear três momentos essenciais para criar felicidade e dar sentido à vida, estes seriam:
  • Relacionamentos significativos,
  • Gratidão e,
  • Viver no momento presente com ‘atitude de abertura e curiosidade’.

Praticamos neste dia e durante, o “curtimento do presente", nos estreitando em braços e abraços, a gratidão transbordou em toda sua plenitude e nos abrimos para a vida, projetando através dos olhares a curiosidade menina. E então, vivemos realmente um magnífico dia!

Na imagem adiante, minha lembrança daquela que soube cultivar o jardim, cuidar das flores e preservar os perfumes. Tinha nos olhos físicos o esplendor da caridade, muita fé e transbordava-se em esperanças!

Roberto Costa Ferreira, Domingo, 13Mai2018


quarta-feira, 9 de maio de 2018

A PÁ e a LAVRA – PALAVRA


A Palavra - A pá lavra
A Pá

Do latim “pala”, pá de cavar. Utensílio que consiste numa lâmina larga e chata, de ferro ou madeira, como se fosse uma grande colher, adaptado a um cabo comprido,  usado em atividades agrícolas, etc., cavando o solo, removendo a terra, areia, carvão, lixo... Ainda, o braço de hélice ou de outro instrumento rotativo similar.

A Pá de cal... “Jogar uma Pá de cal”.
Tal expressão popular que remete ao costume de se encerrar um sepultamento com a cal. Tal procedimento maximiza a decomposição e evita a contaminação do solo. Ainda, “encerrar”, “dar por acabado”... É dizer que fará uma última referência a um assunto não prazeroso.

A LAVRA
Cuja ação ou efeito que compreende preparar a terra para o cultivo, a lavoura, utilizando ferramenta ou aparelho agrícola; revirar. Bordar ou realizar ornamentos em: Lavrar uma peça em ouro.

Lavra ainda é sinônimo de CULTIVAÇÃO... De FABRICAÇÃO: vinho da sua lavra, LABORAÇÃO: versos da minha lavra, tendo por ANAGRAMA, entre outras “lavar”, “alvar” e “varal”!
Assim, passemos ao exercício de reflexão sobre as possibilidades de realização de “juntura de palavras”, cujo fenômeno significa “juntura intervocabular”.

A PALAVRA


“A palavra tem o dom de ferir...!” Podem, as palavras, até curar, mas também, “ferir profundamente quem as ouve”!
Um ferimento positivo, claro, nem sempre fere negativamente. Nem sempre a gente tem a oportunidade de “ser ferido” de maneira positiva pela palavra!

É tão mais comum a gente “ser ferido” pelo lado negativo dela... Mas a palavra é uma “pá que lavra”, que abre a terra “... Da mesma forma que nós precisamos “abrir os sulcos” para que as sementes sejam depositadas!
Então, você olha para aquele chão duro e, quando possível, é preciso “passar um maquinário... Se o tivermos!” Se não, “vamos à nossa enxadinha mesmo”!

Eu me lembro de que, tantas das vezes ajudei a minha mãe “a fazer canteiros”... (Conversávamos sonhando com o futuro possível) Então a gente plantava os nossos sonhos! As alfaces, “as nossas alfaces”, “nossas couves”... Almeirões e tomatinhos!
Um pouco já fui agricultor também, no sonhar de minha mãe! A gente adubava aquela terra... Sendo que o Primeiro Passo era “quebrar a dureza”! Com uma “enxadinha de pensar” ela me ensinava e a gente “ia revirando aquela terra”... E a medida que a gente revirava a terra, a gente ia ferindo aquele chão, a gente ia jogando adubo que, na verdade, “eram os estercos que a gente catava”... Também já “passei por esta humilhação”: de recolher BOSTA!

Feliz humilhação! No fim do dia “você precisava ser jogado fora”, pelo cheiro que ficava! Sim, a gente nos sonhos, também passeava pelos pastos e coletava BOSTA! Então, juntos, a gente “cortava aquela terra”, “lavrava”... Logo, o lavrador é aquele que lavra!
Desse modo eu tenho comigo uma “Pá que Lavra”! Que abre os sulcos pra que eu tenha condições de jogar ali as minhas sementes... Nós somos assim também!

A estrutura mental precisa ser ferida, necessita sofrer a “poda neural” para aprender. Foi tão interessante descobrir que “o aprendizado é outra coisa senão o ferimento delicado cerebral”!
Quando eu tenho o “registro de uma informação que até então eu não tinha, e o cérebro, quanto mais ele conhece mais ele vai ficando cicatrizado”...

As inúmeras formulações que nós vamos fazendo, as sinapses que vão me permitindo conhecer, aprender as coisas do mundo, tudo porque um dia eu “exercitei ler, ouvir”, e aquilo foi guardado “dentro de mim”, tornou-se uma informação, começou a fazer parte de mim e depois você já não consegue nem mais “separar-se daquilo que você sabe”... É você!
É tão interessante que o crescimento muscular é a mesma coisa. Não cresce o músculo todo, deitadinho, esperando as coisas acontecerem... Se faz um esforço, provoca nele uma “micro lesão” que depois o alimento, o sono, importantíssimo, vão sedimentar uma “cicatrização”, tornando-te mais forte!

"Os especialistas dizem que quanto mais a gente fortalece a nossa musculatura na juventude, menos dores a gente sentirá na velhice”!
O músculo precisa ser forte... Eu me lembro de que quando a minha mãe foi fazer uma cirurgia na perna, sob o risco de trombose, já com avançada idade, o médico comentou: “Que musculatura forte tem a sua mãe”!

E não foi nas academias que ela adquiriu tal consistência naquela musculatura... Foi fazendo “agachamento, curvando-se para pegar a roupa lavada e torcida na bacia, após cobrar-se no tanque para esfregá-las e então, levantar-se para, na ponta dos pés, alcançar o alto varal em bambu, pendurando a roupa limpa, quer no frio, ou sob intenso sol de verão”!
Assim, a musculatura forte também “ela foi lavrada” todo dia, “pelo esforço, pelo sacrifício, ela cresceu, tornou-se forte, envelheceu”... A mesma coisa a nossa mente!

O profeta, quando ele “lavrava as consciências das pessoas, era justamente para transformá-las”... Qual era a grande missão do profeta?

“Dizer o que a gente não estava acostumada a ouvir!”
Havia um modo de viver que já estava assimilado, perfeitamente assimilado, uma maneira religiosa, social, costumes... Sim! Nós estamos todos moldados dentro de uma mentalidade...


E “o profeta é justamente aquele que percebe que dentro dessa forma de viver, dentro dessa cultura, há aspectos que nos ‘desumanizam’, como um dia foi natural “olhar para o negro” e entende-lo como um ser de 2ª grandeza”!
Sim, pensar que um dia isso foi aceitável... Isso foi jurídico!

Nos EUA, até o século passado admitia-se a possibilidade de “separar os lugares... Aqui os brancos, ali os negros”... E as pessoas achavam isso normalíssimo. De repente uma voz se ergue! Aliás, fez 50 anos recentemente que ele morreu...
Martin Luther King Jr., um pastor protestante que ousou dizer:

“Não, nós não somos inferiores a vocês só porque somos negros... Somos filhos do mesmo Pai... Apenas somos diferentes”!
E este homem sofreu, sofreu, sofreu, “mas ele semeou nas novas consciências”. Ele semeou, ele lavrou, com a sua palavra, com a sua “forma inconformada” de compreender o mundo!

A possibilidade de estarmos hoje, todos juntos e sentados no mesmo lugar, espaço, e nos soaria ”extremamente desagradável” se alguém entre nós se sentisse melhor que o outro “devido à sua cor”!
Infelizmente ainda soa estranho, natural entre nós a gente ‘se achar estranho’ porque temos uma posição política diferente, ou porque temos uma classe social que se acha superior, que temos um pouco mais de conhecimento... Mas as vozes, as palavras dos profetas vão “abrindo as nossas mentes para que ‘o novo sangue corra”!

Para que a gente ache, sim, estranho um ser humano tratar outro (ser humano) de maneira desrespeitosa, “porque ele sabe mais... ou porque ele tem mais dinheiro”! É assim que a gente evolui... As “casas grandes” que nós construímos, eles acham tudo isso um absurdo! Porque eles querem viver, eles querem ser livres, eles querem trabalhar a possibilidade de se casar, de sair deste lugar aqui e morar num outro...
Carro pra que mãe! Se estivesse viva eu diria... Ando de UBER, vou de ônibus... Não quero ter essa despesa, não quero ter esse trabalho, mãe! Nós vamos comprar um apto! Não mãe, pelo amor de Deus! Vou morar de aluguel porque se não gostar, vou morar noutro lugar... Posso mudar!

Nós não...! São outras mentes... Estão “lavradas” pela modernidade que eu não! Se é bom ou ruim, ‘ainda é cedo para se dizer, poder avaliar’!
O que eu sei é que nós somos necessitados de “PÁ que lavre a nossa mente”, pra gente não morrer na mesmice! E se tem uma “” que:

“eu gosto de fazer cavar no chão da minha vida, é a certeza do amor de Deus por mim”!  
E se tem uma “PÁ” que eu gosto de quebrar no solo das pessoas:

“É esta certeza de que nós somos filhos da misericórdia, que não há nada que não tenhamos feito nessa vida, que possa nos tirar da ‘certeza de que Ele nos ama’, que ele cuida de nós”! 
Lavre a sua mente! E permita que a certeza desse amor do Senhor por você seja o seu escudo, seja a sua proteção!


Roberto Costa Ferreira, 30Mar2018 – Paixão Cristo/Iniciação

 restando também à conhecer do amigo padre em 09Abr2018.

terça-feira, 24 de abril de 2018

RÁ-TIM-BUM


Rá-tim-bum não é nem nunca foi uma maldição... Isso é uma superstição sem base bíblica nem histórica. Devemos ter a maturidade para analisar o que ouvimos e rejeitar mentiras bobas. “Examinai tudo. Retende o bem” (1 Tessalonicenses 5:21 acf.). Quando nos deixamos levar por esse tipo de coisas, isso desvia a atenção do verdadeiro evangelho. A tolice de tomar posições extremas sobre assuntos secundários traz vergonha e dificulta a pregação da verdade.

Não é bom dar atenção a mitos, cuja narrativa de caráter simbólico-imagético, relaciona-se a uma dada cultura, que procura explicar e demonstrar, por meio da ação e do modo de ser das personagens, a origens de certas coisas, por vezes crenças comuns consideradas sem fundamento objetivo ou científico, e vistas apenas como histórias de um universo puramente fantasioso, a exemplo do ÁUDIO que, adiante e abaixo inseri propositalmente. Quase convincente!

Rá-tim-bum é uma onomatopeia, uma figura de linguagem que permite o uso de vocábulos para  imitar o som de alguma coisa. Nesse caso, rá-tim-bum imita o som de coisas festivas, como tambores e pratos. A palavra surgiu no Brasil por volta dos anos 1920/30 e não existe em nenhuma outra língua (nem é usada em outros países de língua portuguesa).

Ao contrário do que dizem alguns rumores sem fundamento, rá-tim-bum não tem nenhuma ligação com feitiçaria, com a Pérsia, nem o mundo medieval... Surgiu no Brasil, como parte da celebração de aniversário e é uma palavra moderna, tipicamente brasileira. Qualquer associação à maldição ou bruxaria não tem base na verdade.

Sua origem é inusitada: o ‘rá-tim-bum’ teria surgido nos corredores da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo (USP), na década de 1920. Naquela época, um RAJÁ indiano proveniente da região de Kapurtala (governante, um tipo de título proveniente da palavra ‘rajan’ que em sânscrito significa “rei”, termo que designa os príncipes dos Estados que deram origem à Índia), chamado “Timbum” visitou a faculdade. Evidente. Não demorou muito para os festivos e contagiantes estudantes começarem a brincar com a sonoridade do nome do nobre sujeito.

Os aspirantes a advogados fizeram uma bordão, dos muitos produzidos à época, juntando "rajá com timbum", dando chance aos mesmos de incorporar, ao final dos seus cantos novo grito de guerra: "Ra-já-Tim-bum!" Com o tempo, o “” foi deixando de ser pronunciado e virou "rá-tim-bum". Aliás, toda a segunda parte da canção “Parabéns a Você” nasceu também nos corredores da Faculdade de Direito da USP - Largo São Francisco/SP,  também: 
É o Pic-pic, é o Pic-pic, é o Pic-pic!
Era uma saudação ao estudante Ubirajara Martins  de Souza, bacharelado por tal faculdade em 1927.
O cara era vaidoso e conhecido entre os colegas  pelo apelido de "Pic-Pic" porque, portador de barba imponente usava uma tesourinha cujo peculiar som de corte para aparar a barba e o bigode pontiagudo, sempre ecoava: "pic, pic, pic, pic”.
Meia hora, meia hora, é hora, é hora, é hora!”
Era outro bordão dos estudantes usado nos bares próximos à faculdade - famosas Leiterias. Eles precisavam esperar meia hora por uma nova rodada de cerveja, tempo de a bebida gelar nas "barras de gelo" usadas então. Quando chegava o tão aguardado momento, gritavam: “É meia hora, é hora, é hora, é hora, é hora!”.

Todas essas frases eram cantadas no principal bar de encontro: o Ponto Chic, situado no Largo do Paissandu, no centro de São Paulo, mas de um jeito  diferente de como conhecemos hoje. A versão original era algo como: “Pic-pic, pic-pic, meia hora, é hora, é hora, é hora, rá, já, tim, bum!

A explicação para que "o grito de guerra" de uma faculdade paulistana virasse hit nacional é a seguinte: os estudantes eram figuras bastante conhecidas na sociedade paulistana e, portanto, eram convidados para prestigiar aniversários e lá, animavam a festa com as músicas que inventavam. Foi assim que o "rá-tim-bum" virou presença obrigatória em aniversários de norte a sul do Brasil, partindo das Arcadas.

Enfim, parafraseando a Bertolt Brecht, personagem vivido pelo comediante Mário Tupinambá, que interpretava dita figura da “Escolinha do Professor Raimundo”, acostumado a repetir sempre a frase:

“A inguinorança é que astravanca o pogressio!” É realmente a ignorância estimulada por incompetentes.

Roberto Costa Ferreira, 20Abr2018.